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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29

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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty E se eu não quiser lembrar? #17

Mensagem  gwen Dom Jul 13, 2008 4:40 am


Achei que devia contar a história de como esta fic surgiu antes de a postar.
Vai ser um texto chato e sem interesse, portanto sintam-se à vontade para passar já ao post seguinte, onde está o primeiro capítulo.


Estava eu aborrecida numa bela segunda-feira, na última semana de Maio, porque o meu computador tinha pifado, quando me lembrei que a minha mana Isa tinha dito que escrever fazia bem e que eu devia escrever uma fic. Depois de almoço, lá me decidi a começar.
Em dois dias escrevi 40 páginas A4 e fiquei com 11 capítulos completos e uma dor de mão terrível, porque já não me lembrava de ter escrito tanto.
Ao fim de alguns dias, desisti: a história estava a tornar-se demasiado complexa e já tinha projectado mais de 30 personagens - achei que não conseguia continuar uma tarefa desta dimensão. Fechei o caderno e guardei-o. Duas horas depois voltei a abri-lo, achei que a história merecia ser acabada.
Fiz esquemas para não me perder e, no dia seguinte, escrevi o último capítulo - um dia hei-de lá chegar.
Acabei por deixar a Isa e uma das minha sobrinhas (a Joaninha) lerem e elas pediram para postar aqui no fórum, mas eu disse que não.
Até que chegou o dia 29 de Julho e vi uma pequena parte da família reunida e regressei a casa com vontade de aceder ao pedido da Isa e da Joaninha.
Assim, dedico a fic à família das Taradas Chiques, por todo o bem que me têm feito e por todos os sorrisos que me provocam.
Mas, esta fic não podia deixar de ser especialmente para a Isa - sem ti, maninha, ela não existia.
Obrigada Isa, por fazeres o sarilho existir. Por insistires que o passasse para Word e por leres de forma tão entusiasta os primeiros capítulos. Obrigada pelas fantásticas críticas.
Obrigada Joaninha, Lóide, Cats e Pati, por acharem que devia postá-la, mesmo que algumas de vocês ainda tenham lido pouco.
Obrigada Joaninha e Lóide, pelo entusiasmo com que leram todos os capítulos que vos deixei ler até agora, pelas fantásticas críticas e pelas especulações absolutamente deliciosas.
Obrigada Lóide e Sara, por ajudarem a classificá-la de acordo com as novas regras e por prometerem não revelar os detalhes que vos dei para conseguirmos classificá-la devidamente.


Para quem se dedicar a ler a fic, desde já obrigada.
Sintam-se à vontade para desistir a qualquer altura, porque tenho consciência que não é uma história fácil de seguir.
Para as mais corajosas e persistentes, que não desistam, deixo dois avisos:
1. A história está inicialmente escrita em flashbacks, pelo que não é fácil de seguir. Mais há frente há-de ser contada de forma mais linear, mas não vos sei dizer quando, até porque ainda não escrevi até lá e já tenho 30 capítulos prontos. Assim, se não se quiserem perder, tenham atenção a todas as datas que vos vão aparecendo, porque a história avança e recua constantemente.
2. Todos os detalhes são importantes. Eu sou um bocadinho obcecada por pormenores e vai daí tudo, ou quase tudo, nesta fic tem um motivo, uma razão de ser e nada, ou quase nada, está lá por acaso.
Enfim, não é por acaso que lhe chamo sarilho. É que isto é de facto um grande sarilho, não só de escrever, mas também de acompanhar, porque é uma fic realmente complexa.


Finalmente, a fic chama-se E se eu não quiser lembrar?
beijos


Última edição por gwen em Qua Set 03, 2008 10:49 pm, editado 19 vez(es)
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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty E se eu não quiser lembrar? #1

Mensagem  gwen Dom Jul 13, 2008 4:50 am


Aqui fica o primeiro capítulo.
Espero que gostem.
beijos

# 1
Hamburg, 22 de Janeiro de 2009

Está frio, muito frio. Mas as tardes de Janeiro são sempre frias na Alemanha, mesmo em dias de céu limpo, como hoje.
Estamos fora de casa há duas horas e devemos volta em breve. Êl está sentada num banco de jardim, reclinada, a cabeça ligeiramente deitada para trás. Ela gosta de sol, por isso deixa que os seus raios lhe acariciem a face morena.
Eu estou um pouco afastado, junto ao rio, a ver a água correr. De onde estou consigo ouvir o que dizem, ou conseguiria, caso falassem. Desde que chegámos, Êl ainda não falou, tem estado apenas a apanhar sol. Dizem que o sol de Inverno faz mal, mas a médica não lhe disse que fugisse do sol, portanto ela não foge – ela gosta tanto do sol… E do rio. É por isso que estamos aqui – ela gosta de ver a água do rio correr, ou ouvi-la. Hoje não pode ouvir o rio, porque estamos na cidade, mas quando podemos afastamo-nos. Então, sentamo-nos junto ao rio, fechamos os olhos e ficamos a ouvi-lo, só os dois.
Agora já não estou a ver o rio, estou a observar Êl. Está mais bonita. Sempre foi, mas agora que as cicatrizes começam a desvanecer-se e a sua cara parece ter desinchado por completo, está ainda mais bonita.
É magra, muito magra, talvez mais do que deveria. Mas o que é que eu percebo disso? Agora não se nota, por causa das várias camadas de roupa que foi obrigada a vestir. Mas deviam vê-la no Verão, eu não conheço nenhum outro ser humano que tenha tantos ossos! Se bem que agora está melhor. Engordou consideravelmente nos últimos meses, mas mesmo assim continua magra, muito magra.
O sol parece gostar da sua face morena. Eu prefiro o seu cabelo – longo, preto, escadeado. Hoje está a usá-lo esticado, porque gosta de se ver assim, mas eu prefiro vê-la com canudos, parece uma princesinha oriental. Mas do que as pessoas realmente gostam nela é dos seus olhos. Ninguém sabe de que cor são, variam entre o verde, o azul e o cinzento. Parece que o estado do tempo e do seu espírito os influenciam, mas ninguém, nem mesmo a própria Êl, sabe como. Hoje estão verdes, não é um verde límpido, nunca é, há sempre algo de cinzento neles.
Está um amigo connosco, o seu melhor amigo, aquele em quem ela confia sempre, o primeiro de quem ela se lembra – é por isso que ela confia nele, ele é a sua memória mais antiga.
Tem estado sentado junto de Êl, a observá-la, a certificar-se que a sua respiração está regular. Acha que este sol lhe vai fazer mal, mas não se atreve a dizer-lho, não quer irritá-la… Ela gosta tanto de sol. E depois, de que lhe adiantaria dizer-lhe o que quer que fosse? Já conhece a resposta dela: A médica não disse para fugir do sol. Raio da médica.
Confesso que até eu já não posso ouvir falar na médica, mas ela sabe que só assim poderá ter alguma liberdade. Depois do disparate que fez, os seus amigos tornaram-se ainda mais super-protectores – não querem perdê-la.
Ele continua a observá-la, mas agora de pé. É melhor voltarmos para casa. Os dias de Inverno são pequenos e o sol já está baixo. Começam a formar-se nuvens a norte e a temperatura está a descer – amanhã vai nevar outra vez.
Continuam em silêncio. Êl nem se mexeu, apesar de saber que o amigo se levantou. Ele não quer dizer-lhe que têm de ir… Não quer voltar a discutir… Não hoje… Já chegou de manhã…
Foi enquanto tomavam o pequeno-almoço.
- Hoje quero sair, ver o rio, tenho saudades do rio.
Ficou um silêncio terrível naquela cozinha. Êl ainda não tinha saído de casa, a não ser para ir ao médico, desde que voltara do hospital, quatro dias antes. E foram dias penosos:
A médica não disse que tinha de ficar na cama!
Cá em casa está quentinho e a médica não disse que não podia andar descalça!
E não estou descalça! Estou a usar umas meias grossas!

Ouvimos coisas deste género todos os dias, durante todo o dia.
Enfim, Êl tem estado insuportável. O facto de estar fechada em casa e de lhe terem tirado os cabos do computador, para que não possa trabalhar, deixam-na irritada. Para piorar, tem dormido ainda mais mal do que o costume – ainda lhe custa respirar à noite. E a Êl com sono é impossível de aturar.
Alguém ia ter de quebrar o silêncio daquela cozinha. Foi Êl. Olhou directamente para os olhos dele.
- Nem penses em dizer que não. Tu ouviste o que a médica disse ontem, já estou muito melhor. E não posso passar a vida trancada nesta casa.
- Mas tu adoras esta casa… – começou Mark.
- Não te atrevas a ficar do lado dele! Não sou nenhuma criança para me tratarem como tal. E também não sou feita de cristal para andarem comigo ao colo. Se cair não parto, levanto-me
Voltou a olhar para ele. Ele seria o mais difícil. Era sempre.
- Mas Êl, tu ainda estás fraca e…
- E o quê? A médica não disse para continuar em casa, logo, já posso sair.
- Mas Êl, está tanto frio…
- Visto mais roupa. Toda a roupa que quiseres e luvas e cachecóis e gorros e meias, montes de meias – tudo o que quiseres.
- Se calçares montes de meias não vai haver calçado que te sirva.
Ele não devia ter dito aquilo. Tentar fazê-la rir não foi uma boa opção. Êl levantou-se, deitando a cadeira ao chão, com a respiração alterada.
- Êl, querida, por favor, acalma-te. Olha a tua respiração. – Disse ele levantando-se devagar.
- Acalmo-me? Achas que é fácil para mim? Não consigo respirar bem. Não consigo dormir bem. Voltei a ter pesadelos! – Gritou ela.
Ficámos todos quietos. Os pesadelos de Êl nunca são bons, sobretudo aqueles em que não acorda aos gritos – são os piores. Ninguém se atreveu a aproximar-se, ela não ia deixar que lhe tocassem, a não ser, talvez, ele… Talvez…
A respiração de Êl começou a normalizar-se. Os minutos passavam devagar, ninguém falou. Tinha de ser ela a dar o primeiro passo.
- Eu sei que fiz asneiras a semana passada. Eu sei que estão preocupados comigo. Mas eu estou bem e já prometi que não volto a magoar-me, seja de que maneira for. Eu cumpro sempre o que prometo.
Êl parou. Precisava recuperar o fôlego. Os seus olhos estavam muito verdes e marejados de água. Por momentos pensei, que fosse chorar, mas não, ela quase nunca chora, mesmo quando lhe apetece, ela não chora, a não ser quando não aguenta mais. Quando voltou a falar, a sua respiração estava quase normal.
- Eu preciso sair daqui. – Recomeçou com a voz insegura. – Só um bocadinho. Eu adoro-vos. E adoro estar em casa convosco. Mas estou aborrecida. Nem sequer posso trabalhar para me distrair. E hoje não está tanto frio. Esta noite não nevou e está um sol tão lindo. Já viram o sol?
Êl continuou a fitá-lo com ar de súplica. Por fim, ele cedeu. Estava a doer-lhe vê-la tão desanimada.
- Está bem. Esta tarde, depois de almoço, saímos um bocadinho. Vamos ver o teu rio. Mas vestes ainda mais roupa do que quando vamos ao médico. Se bem te conheço vamos passar pelo menos uma hora junto àquele rio e não podes arrefecer. Ah! E eu conduzo.
Ela sorriu. Um sorriso triste, são sempre assim os seus sorrisos. Estava calma, a sua respiração voltara ao normal. Os olhos continuavam verdes, mas já não tinham água.
- Está bem. Vou tomar banho. É verdade, Mark a tua mãe telefonou logo de manhã. Pediu para lhe ligares assim que acordasses. – Êl é quase sempre a primeira levantar-se.
- Eu não acredito! Ainda ontem saí de casa e ela já está a chatear-me. – Todos riram. Até Êl.

Continua...

beijos


Última edição por gwen em Qua Jul 30, 2008 11:59 pm, editado 2 vez(es)
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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty Re: E se eu não quiser lembrar? #28 e 29

Mensagem  _Sara_ Seg Jul 14, 2008 10:59 pm

awwwwwwwwwww *_________*

Fan fic neste fórum titia *.*

E como fan num 1 mi ser a primeiríssima a comentar Very Happy

Já sabes que amei logo o primeiro capítulo!!

Vamos ´lá ver o que vai acontecer
s seguir.
Amo a tua maneira de escrever
a tu maneira de passares o que se passa na história
bem como os sentimentos inquiridos por cada um!

Parabéns pelo teu excelente trabalho.

Uma primeira fic
Uma primeira obra de arte ...

Espero que em breve continue a ler mais
obras tuas porque são entusiasmemtes e
sem dúvida alguma lindíssimas.

Beijinhos titia.
Beijinhozzz*
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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty Re: E se eu não quiser lembrar? #28 e 29

Mensagem  gwen Ter Jul 15, 2008 1:48 am

_Sara_ escreveu:awwwwwwwwwww *_________*

Fan fic neste fórum titia *.*

E como fan num 1 mi ser a primeiríssima a comentar Very Happy

Já sabes que amei logo o primeiro capítulo!!

Vamos ´lá ver o que vai acontecer
s seguir.
Amo a tua maneira de escrever
a tu maneira de passares o que se passa na história
bem como os sentimentos inquiridos por cada um!

Parabéns pelo teu excelente trabalho.

Uma primeira fic
Uma primeira obra de arte ...

Espero que em breve continue a ler mais
obras tuas porque são entusiasmemtes e
sem dúvida alguma lindíssimas.

Beijinhos titia.
Beijinhozzz*

Sendo esta fic dedicada às TC, sobretudo a uma delas, a minha maninha Isa, não poderia deixar de a postar no fórum das TC.

beijos
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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty Re: E se eu não quiser lembrar? #28 e 29

Mensagem  gwen Ter Jul 15, 2008 1:52 am

Antes de mais obrigada a quem leu e comentou.
Quando postei o primeiro capítulo esqueci-me de fazer um pequeno aviso, por isso vou deixá-lo agora.
Quando comecei a escrever a fic tive preguiça de fazer pesquisa. Assim sendo, não sei se todas as situações são possíveis do ponto de vista clínico e sobretudo do ponto de vista legal. Em todo o caso, no mundo da imaginação tudo é possível.
Deixo-vos o segundo capítulo, espero que gostem...
beijos

# 2

Estamos os dois de pé a observá-la. Ela sabe que ele se levantou, sabe que tem de ir, mas não quer. O sol sabe-lhe tão bem. Continua de olhos fechados. Está a ouvir a conversa de um grupo de raparigas que se encontra ali perto. Pelo que percebeu, são de diferentes países, por isso falam em inglês. Estão na Alemanha com um grupo de voluntariado para receber formação.
De repente, uma das raparigas solta uma gargalhada sonora e Êl abre os olhos. Aquilo pareceu-lhe familiar. Já ouviu algo parecido, mas onde?
Foi num sonho. Não foi num pesadelo. Foi num sonho. Êl também tem sonhos agradáveis, são raros mas tem.
Foi no mês passado, quando estavam de férias na Nova Zelândia. Êl acordou bem-disposta, com um dos seus sorrisos tristes, mas menos triste do que os do costume. Nesse dia foi a última a levantar-se, o que também não era normal, mas parecia ter dormir melhor do que o normal. E tudo por causa de um sonho agradável.
Êl estava numa esplanada. Havia livros e cadernos em cima da mesa, por entre sandes, copos de sumo e leite chocolatado. Na mesa de Êl estavam mais quatro pessoas, três rapazes e uma rapariga. Eram delas os pequenos pacotes de leite.
Todos riam de algo que Êl tinha dito e a rapariga soltava gargalhadas sonoras, únicas – não era possível que mais alguém risse assim.
- E ainda me perguntam porque gosto de ti! – Dizia a rapariga para Êl. – Gosto, porque sim! Ninguém me pergunta porque gosto de leite chocolatado, porque não preciso de um motivo para gostar. Então, porque havia de precisar de um para gostar de ti?
Êl não se lembrava do que tinha dito no sonho que tanto fizera rir os amigos. Sim! Tinham de ser amigos. Amigos de outra vida. Amigos de antes daquela noite no parque…
Não se lembrava dos rostos daqueles jovens do seu sonho, nem de que falavam os livros que estavam em cima da mesa, mas aquela boa-disposição animou-a. Afinal, talvez houvesse algo bom para recordar, talvez nem tudo fosse mau na outra vida, aquela que estava escondida… E, pela primeira vez, Êl quis saber quem a tinha magoado…
Infelizmente durou pouco. Na noite seguinte, voltou a ter pesadelos. Normalmente não se lembrava dos pesadelos, apenas sabia que eram maus, sentia que eram maus… Acordava de noite a gritar e não deixava que lhe tocassem, a não ser ele, porque nele confiava sempre, mesmo quando o seu inconsciente lhe dizia que todos podiam ser inimigos.
Ele tinha estado sempre lá, a qualquer hora, todos os dias, mesmo que fosse só do outro lado do telefone. Ele tinha sido o primeiro a olhá-la nos olhos e a dizer-lhe: Eu não vou fazer-te mal, nem vou deixar que ninguém faça. Prometo!
Mas aquele pesadelo, na Nova Zelândia, uma noite depois do sonho que tanto a animara, foi diferente. Não acordou aos berros, mas lembrava-se vagamente do que tinha sonhado. Nesse dia ninguém lhe tocou… Ninguém… Na noite seguinte não dormiu. De manhã procurou o único em quem confiava sempre, abraçou-o e deixou-se ficar, durante horas, a sentir a sua protecção. Depois disse-lhe apenas: Eu lembro-me…
Os pesadelos continuaram, quase todas as noites. Nunca tinham sido tão frequentes. Os amigos passavam as noites no quarto dela, um de cada vez, só Liesel não o fazia, não suporta ouvi-la gritar quando acorda.
Quando regressaram à Alemanha, mais de 2 semanas depois, as coisas pareceram acalmar. Os pesadelos tornaram-se mais raros, mas o acordar era silencioso. Os dias em que não permitia que ninguém lhe tocasse eram cada vez mais frequentes. E depois, numa manhã…
Êl abana a cabeça, como se saísse de um transe. Não gosta do que aquela gargalhada a fez recordar.
- Estás bem?
- Estou, já passa. Não te preocupes.
Mas ele está preocupado. O pequeno sorriso, que Êl tinha enquanto sentia o sol na cara, desapareceu. Ela sente a preocupação dele. Volta a sorrir.
- Para quem não me queria deixar sair de casa, deixaste-me aqui estar muito tempo. E sei que estás a pensar que este sol me vai fazer mal. Fazemos assim: se eu piorar, só volto a sair de casa quando tu achares que posso. Prometo.
Agora ele também está a sorrir.
Êl levanta-se, está com um olhar estranho, travesso.
- Estás horrível com esse gorro. Devias ter trazido um do teu irmão.
Estica o braço para lhe tocar, mas não o faz. Ele prefere ignorar o gesto dela, é melhor assim, ela voltou a ter pesadelos e não acordou a gritar… Ela lembra-se…
- Como se o teu fosse melhor! – Responde de sobrolho levantado.
- Pois, também devia ter trazido um do teu irmão. – Diz-lhe com um sorriso. Depois olha para mim: - Ve, vamos para casa?
Vira-nos as costas para olhar o grupo de raparigas, precisa saber quem é a dona daquela gargalhada. Uma das raparigas vê Êl e tira os óculos de sol. Parece petrificada, ficou tão pálida… Dirige-se a Êl lentamente. Aquele movimento não nos agrada, por isso damos um passo em frente, ficando ao seu lado. Eu estou à sua direita.
A rapariga compreende que não a vamos deixar aproximar mais e pára. Está a um metro de nós. É da mesma altura que Êl, tem cabelos e olhos castanhos. Fixa Êl, sorri ligeiramente, depois os seus olhos enchem-se de água e duas lágrimas percorrem-lhe a face.
- Êl, és mesmo tu? – Pergunta-lhe em português.
As duas ficam a olhar-se fixamente.
Continua...


Última edição por gwen em Qui Jul 17, 2008 1:30 am, editado 1 vez(es)
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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty Re: E se eu não quiser lembrar? #28 e 29

Mensagem  mara_crazygirl Ter Jul 15, 2008 12:29 pm

gostei mt da tua fic, espero q voltes a postar novos capitulos Smile

bjoz
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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty Re: E se eu não quiser lembrar? #28 e 29

Mensagem  gwen Qui Jul 17, 2008 1:31 am

mara_crazygirl escreveu:gostei mt da tua fic, espero q voltes a postar novos capitulos Smile

bjoz

Obrigada.
Fico feliz por gostares.

beijos
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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty Re: E se eu não quiser lembrar? #28 e 29

Mensagem  gwen Qui Jul 17, 2008 1:37 am

Terceiro capítulo...
Que não era para postar hoje, mas como terminei mais um...
Que dizer do terceiro capítulo...
Bem, é a continuação do segundo.
Espero que gostem.
beijos


# 3


Êl está habituada a ser reconhecida na rua, mas isto é diferente. Nunca ninguém chorou, nunca lhe falaram em português. Está na Alemanha, porque haviam de falar-lhe noutra língua que não alemão?


Desde que voltaram da Nova Zelândia, ainda não a tinham abordado na rua – estava diferente, as cicatrizes notavam-se menos por estar ainda mais morena. Liesel até havia sugerido que quando regressassem à Alemanha deveriam divulgar novas fotos.


- Talvez agora alguém…


Mas Liesel não terminou a frase… Sabia que era doloroso e todos percebiam o que ela queria dizer.


De volta à Alemanha, os médicos ficaram felizes com o que viram – o ar quente tinha-lhe feito bem. Êl tinha a cara menos inchada, as cicatrizes estavam finalmente a desaparecer. Decidiram esperar mais um pouco antes de divulgar novas fotos, para ver se ainda havia mais melhoras. Só que depois…


Êl prefere quando as pessoas não a reconhecem na rua. É menos doloroso. Mesmo que as pessoas se esforcem por não o fazer, é difícil não a olhar com pena. Parte da sua história foi divulgada assim que a equipa de psiquiatras e psicólogos considerou que Êl estava pronta para enfrentar o mundo. Mas sem sucesso. Passou um mês e ninguém foi capaz de dar informações credíveis. Depois, a história atravessou as fronteiras da Alemanha e espalhou-se pela Europa.


Ninguém sabe em que parte da Alemanha Êl vive. Não é seguro. Afinal, não sabemos o que lhe aconteceu, nem como foi parar àquele parque, naquela noite.


Êl tem agora uma ideia do que lhe fizeram – os pesadelos dizem-lho. Mas não conta a ninguém. E não sabe quem ou porquê. E não quer saber… Tudo que ela quer é que os pesadelos parem e esquecer o que sonhou, para que possa voltar a ser feliz. Sim, porque ela foi feliz, quando decidiu enfrentar o mundo e antes de os pesadelos começarem…


Lembro-me do primeiro pesadelo. A casa toda acordou com os seus gritos. Tínhamo-nos mudado há pouco tempo. Íamos viver todos juntos, mais os peixes e os pássaros e os esquilos e os hamsters e a tartaruga… A nossa casa parece um Zoológico…


Havia amigos lá em casa, que tinham ido passar o fim-de-semana connosco para conhecerem a casa. Foi de madrugada, deviam ser umas 4 horas. Tinham ficado acordados até tarde, a conversar e a rir, mas depois Êl não conseguia dormir. Fran ficou a ver o irmão adormecê-la. Só ele a consegue adormecer – deita-se ao seu lado e fica a passar-lhe a mão na testa até ela ser vencida pelo cansaço. Os outros já tentaram, mas não resultou.


Quando Êl finalmente dormiu, Fran viu o irmão dar-lhe um beijo leve na testa e dirigir-se ao seu quarto. Levantou-se da poltrona em que estava sentada e saiu deixando a porta entreaberta.


Fran desceu à cozinha para beber um copo de leite. Quando regressava ao quarto, passou em frente da porta de Êl e ouvi-a gemer. Enquanto abria mais a porta, Êl sentava-se na cama aos gritos. Fran aproximou-se, mas ela gritou-lhe que se afastasse. Há muito tempo que Êl não fugia ao contacto com os outros e isso assustou mais Fran do que os gritos da amiga. Êl só se acalmou quando se deixou abraçar por aquele que sempre o conseguiu fazer. Ficaram sozinhos, mas não voltaram a dormir.




É sempre doloroso quando a reconhecem na rua. Olham-na com tristeza, mas sobretudo com pena. Alguns mais corajosos, ou mais curiosos, arriscam falar-lhe. As perguntas são sempre as mesmas.


Tem conseguido aguentar-se? Conseguiu seguir com a sua vida? Começar do zero? Lembrou-se de alguma coisa?


Há-de lembrar. Ou alguém há-de descobrir. Vai ver, quem lhe fez aquilo há-de pagar.


Porque têm as pessoas de falar com ela? Não vêem que a deixam pior?


Mas as pessoas não sabem tudo. Ninguém sabe, Êl não deixa…


Quando falam com ela na rua, Êl quase nunca responde, porque quase nunca precisa. As pessoas dizem tudo de um fôlego só. Sabem que ela não se lembra, se houvesse desenvolvimentos no seu caso já teria sido noticiado. As perguntas são de retórica. As pessoas querem apenas mostrar-lhe que a apoiam, que ela não está só.


Êl limita-se a sorrir e as pessoas, ao verem o seu sorriso, normalmente arrependem-se de lhe terem falado. ninguém esquece aquele sorriso, se o vissem ia perseguir-vos - tão triste, tão vazio..


- És tu, não és Êl? – Voltou a rapariga a perguntar.


Elas continuam a olhar-se fixamente. Agora também o grupo de raparigas se aproximou, uma arrisca chamar a colega.


- Petra? Está tudo bem? – Fala-lhe em inglês. Parece que mais ninguém fala português, a não ser Petra. E Êl. Sim, Êl também fala português, entre outras línguas.


Êl não sabe o que sentir. Aquela rapariga tem que ser a do seu sonho. Tem que ser uma amiga do passado.


Êl estica o braço esquerdo e toca no amigo. Está aliviada por ele estar ali. Ele vai apoiá-la sempre, independentemente de quem seja Petra e do que ela tenha para dizer. Êl não tem a certeza de querer saber…


Ele percebe finalmente o que se passa, aproxima-se, passa-lhe o braço pelos ombros, beija-lhe a cabeça e dirige-se a Petra em inglês:


- Tu conhece-la? Sabes quem ela é?




continua...
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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty E se eu não quiser lembrar? #4

Mensagem  gwen Sáb Jul 19, 2008 2:10 pm

O narrador do sarilho é um bocado bronco. E vai daí, não é capaz de contar a história de forma linear e começou pelo meio. A partir daqui a história vai dar alguns saltos no tempo e por vezes no espaço. Os capítulos não se passam todos no mesmo tempo e no mesmo espaço, mas acho que dá para ir percebendo. Por vezes temos situações que só percebemos porque acontecem assim, quando lemos uns capítulos mais à frente, porque falam de situações que na realidade aconteceram antes.
Enfim, no capítulo 4 a história anda para trás, para o dia em que o narrador conhece a Êl. Um dia, num qualquer capítulo, não sei bem quando, havemos de regressar ao dia 22 de Janeiro de 2009. Havemos de voltar àquela cena junto ao rio, em que a Petra reconhece a Êl. Quando lá voltarmos, a história já será um bocadinho menos confusa e contada de forma mais linear. Prometo! Só não sei quanto tempo vai demorar...


Desde já
admiro as pessoas que consigam continuar a ler o sarilho durante os próximos capítulos, que serão um bocadinho (muito) confusos. Compreendo se simplesmente desistirem. Para quem continuar e aguentar até ao dia em que a história regressa àquela tarde no rio, deixo desde já a minha vénia - será preciso muita paciência.
Bem, acho que já chega de testamento, só recomendo, mais uma vez, que tenham atenção às datas. Se se perderem avisem, que eu digo-vos datas e espaços.


Espero que gostem do 4 e continuem a comentar...

beijos e obrigada


# 4

Era apenas mais uma manhã de Verão, mas o dia 19 de Julho de 2008 havia de ficar marcado como aquele em que a minha vida mudou.
Estávamos a meio da manhã, quando senti chegar um carro. Dele saiu uma rapariga, amiga de Natasha. Ela costumava ir lá a casa, acho que sempre gostou de mim, pelo menos sempre brincou comigo. Costumava tirar-me fotografias – ela anda sempre com uma máquina fotográfica.
Natasha chamou-me.
- Ve, vem cá. Hoje vais viajar. Vais conhecer uma pessoa muito especial. Talvez possas ir viver com ela.
Pois! A primeira e única vez que ouvi isto não correu nada bem. Tinha sido um ano antes. Um casal veio buscar-me para conhecer a filha deles, queriam adoptar-me. O pior foi quando chegámos a casa – a miúda fartou-se de berrar. Repetiu inúmeras vezes que eu não era normal e não me queria lá em casa. Levaram-me de volta para casa de Natasha e encolheram os ombros dizendo: Ela achou que ele era normal, até o ver. Nós não lhe tínhamos dito como ele é.
Não me apetecia nada voltar a passar pelo mesmo. Mas a amiga de Natasha era tão simpática, talvez a tal pessoa especial também fosse… Eu gostava de viver com Natasha, mas sabia que há muito que era suposto ter partido. Todos os outros tinham partido. Eu só fiquei porque ninguém me quis. É estranho… – Diziam sempre que me olhavam.
Acabei por me instalar no banco de trás do carro. Só então reparei que estava lá mais alguém – era um rapaz alto, louro. Olhou-me com um sorriso e esticou o braço para trás, fazendo-me uma festa na cabeça. Gostei dele.
Pouco depois de partirmos o rapaz falou.
- Estás nervosa?
- O que achas? Já pensaste que a Êl pode reagir mal?
- Já, já pensei. E acho que não há motivos para preocupação. Já viste como ela brinca com os outros? Até aquele horroroso da vizinha dos teus pais se derrete todo quando a vê. – Acrescentou fazendo uma careta.
Falavam como se eu não estivesse ali. As pessoas fazem sempre isso, acham que não percebemos, mas eu percebo e acho que os outros também, afinal só sou diferente por fora.
- Sim, eu sei, mas… – Também ela fazia uma careta.
- Mas o quê?
- E se ela não gosta? Se acha que estamos a tentar impor-lhe algo?
- Mais do que nos impusemos a nós próprios? Pensa. Quantas vezes tinhas ido àquela casa antes dela chegar? E quantas lá foste depois? E ela suporta-nos, acho mesmo que nos adora. É verdade que não podemos aproximar-nos muito, mas também já foi pior. Antes só uma pessoa é que lhe podia tocar, agora já são quatro. Sim, porque a Ilsa não conta.
- Andreas hás-de concordar que não é bem a mesma coisa.
- Não Fanny, não é a mesma coisa. Mas olha bem para ele. Se ela gosta do horroroso da vizinha dos teus pais, como é que não vai gostar dele? É tão fofo…
Ela riu, parecia mais serena.
- Sim, talvez tenhas razão. Mas não voltes a chamar-me Fanny! Não gosto.
- Desculpa. Saiu… – Disse Andreas encolhendo os ombros.
Riram ambos. Natasha também lhe chama Fanny às vezes, quando a quer irritar.
Conhecem-se desde pequenas, andaram na escola juntas, sempre foram as melhores amigas e continuaram a ser mesmo depois de Natasha se mudar com os pais para Beelitz. É costume passarem férias juntas e por vezes, quando precisam de desabafar, juntam-se aos fins-de-semana. Era o que tinha acontecido umas semanas antes…
Franzi apareceu em casa de Natasha num sábado ao fim da tarde. Vinha perturbada, exausta, parecia não dormir há vários dias. Contou a história de Êl, uma história triste…

Foi na madrugada de 25 de Maio. A noite estava fria, muito fria. Dois amigos voltavam da discoteca. Tinha sido uma noite interessante, porque ninguém os reconhecera.
- Há muito tempo que não me divertia tanto.
- Nem eu. Pensei que já não era possível sermos apenas cidadãos anónimos deste país.
- O que é aquilo?
Aquilo era uma rapariga. Andava no meio do parque com alguma dificuldade. Talvez fosse do frio. Talvez estivesse ferida. Seguia em frente, de costas para eles. Usava o que parecia ser um vestido azul-cinza. Tinha cabelo escuro, comprido. Confundia-se com a sombra das árvores.
- Devíamos sair do parque agora. O carro está já ali, do outro lado.
- E ela?
- O que tem ela?
Parecia deslocada e frágil. O longo vestido arrastava no chão, as mangas compridas e largas cobriam-lhe as mãos.
- Achas normal? São quase 5 horas. O que faz aqui uma rapariga sozinha a estas horas?
- Normal não acho. Olha a roupa dela. Parece uma donzela élfica com o cabelo a brilhar à luz da Lua.
- Tu andas é a ler livros a mais. Fica aqui que vou ver se precisa de alguma coisa.
Quando se aproximava viu-a cair de joelhos. Correu para a alcançar. Ajoelhou-se em frente da rapariga, que gemia baixinho, e pôs-lhe a mão no ombro.
Ela estremeceu e levantou a cara – estava cheia de hematomas e pequenos golpes. Retirou uma das mãos de entre as pernas – estava a sangrar.
- Vai buscar o carro depressa! Temos de levá-la ao hospital. – Gritou para o amigo, que começou a correr em direcção ao carro.
Depois olhou-a nos olhos.
- Eu não vou fazer-te mal, nem vou deixar que ninguém faça. Prometo!
Ela desmaiou quando lhe pegou ao colo. Era leve, muito leve. E estava gelada, o vestido era feito de um tecido muito fino.
Acordou dois dias depois e ele estava sentado ao seu lado – não a tinha deixado, nunca mais a deixou. Está sempre lá, todos os dias, a qualquer hora – nem que seja só do outro lado do telefone...

Franzi tinha conhecido Êl alguns dias antes de visitar Natasha no último sábado de Maio. Estava visivelmente perturbada.
- Foram os olhos dela, Natasha. Nunca vi nada assim – estão devastados, como se não houvesse nada por detrás deles, a não ser medo, pânico, terror, desespero… E não sorri, Natasha, nunca. Fala connosco, mas não confia. Estuda todos os nossos movimentos, como se estivesse a certificar-se que não vamos atacá-la. E quando vê muita gente, encosta-se a uma parede, para ter a certeza que não está ninguém atrás dela.
- Que horror Franzi! O que lhe aconteceu?
- Essa é a pior parte. Não sabemos. Ninguém a conhece, a polícia não consegue identificá-la e ela está amnésica. Não se lembra de nada do que lhe aconteceu antes de acordar naquele parque, com frio, deitada na relva.
- Porque lhe chamam Êl?
- Tem isso nas costas e no antebraço esquerdo.
- Como assim, tem?
- Foi escrito com golpes. Uma vez no antebraço, várias nas costas. Alguns golpes estão infectados e não são muito nítidos, mas o do braço é recente, os médicos acreditam que foi feito poucas horas antes de ela chegar ao hospital.

Enquanto recordava a história de Êl, a viagem chegou ao fim e o carro parou finalmente. Andreas abriu-me a porta e dirigimo-nos para a casa. Eu ia conhecer Êl...

continua...
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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty Re: E se eu não quiser lembrar? #28 e 29

Mensagem  gwen Seg Jul 21, 2008 11:40 pm

Deixo-vos o 5.
Não é a continuação do 4, mas também não antecede o 6.
É apenas o 5...
Descobre-se quem é um dos rapazes que encontrou a Êl no parque...
Espero que gostem.
beijos


# 5

- Doutor o que é que ela tem? O que é que lhe fizeram?
- Já lhe disse: não posso responder a isso! A paciente tem direito à sua privacidade e tanto eu como os outros médicos só lhe podemos revelar o diagnóstico a ela.
- E acha mesmo que ela vai falar consigo?
- Por favor, não grite! Está num hospital!

A rapariga tinha acordado nessa manhã. Abriu os olhos devagar, como se não fosse capaz de mexer qualquer músculo do corpo e ficou a olhar o tecto branco. Depois virou a cara para o lado direito e viu um saco de soro suspenso ao seu lado – devia estar num hospital. Fazia sentido, a julgar pelo cheiro. Depois olhou para o lado esquerdo e viu um rapaz magro a dormir num pequeno sofá. Tentou mexer-se, mas tudo o que conseguiu foi emitir um gemido profundo – sentiu dores atrozes no corpo todo. Ele acordou com o gemido dela sentou-se direito e ficou a olhá-la sem saber o que fazer.
Quando o sentiu mexer-se, virou-se para ele e olhou-o nos olhos. Reconheceu aqueles suaves olhos castanhos… Eu não vou fazer-te mal, nem vou deixar que ninguém faça. Prometo!
- Prometes?
- O quê?
- Que não vais magoar-me?
- Prometo.
- Nem vais deixar que ninguém me magoe?
- Ninguém.
Falava alemão, mas com uma pronúncia estranha, pelo que ele não conseguiu perceber de que parte da Alemanha ela seria. Tentou mexer-se novamente, mas ele não deixou.
- Não te mexas. Eu vou chamar o médico.
Abriu a porta do quarto privado, olhou para fora e começou a gritar para o fundo do corredor.
- Olhe, desculpe? Não se importa de chamar o Dr. Kafka? Diga-lhe que a menina do quarto nº 13 já acordou.
Voltou a fechar a porta, devagar, para que não fizesse barulho ao bater. Ela pensou que ele era louco.
- Não devias gritar. Estamos num hospital.
Ele voltou a olhá-la nos olhos. Ela falava com dificuldade, mas era natural dado o seu estado. Tinha hematomas e pequenos golpes em todo o corpo, alguns eram profundos. No dia anterior não o tinham expulsado do quarto antes de mudarem o penso no seu antebraço esquerdo, alguém o tinha cortado de maneira a formar letras – ÊL. O que seria? O que quereriam dizer?
O médico entrou sem bater, o que assustou a rapariga. Ele pôde vê-lo no seu olhar. Parecia relativamente calma enquanto estiveram sozinhos, mas depois estava assustada, a sua respiração alterou-se.
- Bom dia. Sou o Dr. Rudy Kafka.
Olhava directamente para ela, o que pareceu acalmá-la.
- Preciso fazer-lhe algumas questões, para podermos completar o seu processo. Mas já lá vamos.
O médico aproximou-se e ela deixou de o olhar. Procurou o rapaz, o que a tinha encontrado, que prometera não deixar que a magoassem. Dr. Kafka percebeu que a tinha assustado e recuou, indo colocar-se ao fundo da cama. Ao mesmo tempo, ela esticou o braço esquerdo em busca de auxílio. O rapaz aproximou-se e pegou-lhe na mão. Ela pareceu acalmar. Estava tudo bem, ele ainda ali estava, não ia deixar que a magoassem.
- Está tudo bem. Foi o Dr. Kafka que cuidou de ti quando te trouxemos para o hospital. Ele só quer ajudar.
Ela voltou a olhar para o médico.
- Posso fazer-lhe algumas perguntas?
- Sim.
- Onde sente mais dores?
- Não sei. Dói-me tudo.
- É natural. Sente-se tonta?
- Tonta não, mas fraca sim. Sinto que não seria capaz de ficar de pé sem auxílio.
- Também é natural. Eu devia falar a sós consigo.
- Não!
Ela voltou a ficar agitada. Fechou a mão esquerda com força.
- Tenha calma. – O médico falava num tom calmo, baixo, tranquilizador, numa tentativa de lhe transmitir confiança. – Se quiser, ele pode ficar.
- Ficas? – Perguntou-lhe, olhando-o nos olhos, com ar de súplica.
- Sim, fico.
- Muito bem, – Continuou o médico. – tem vários hematomas e golpes no corpo. Uns são recentes, mas outros têm vários dias, os mais antigos talvez tenham duas semanas. Também perdeu muito sangue, por isso tem uma ligeira anemia, mas nada preocupante.
Aquilo estava a assustá-la, por isso o médico achou melhor parar. A rapariga ainda passaria alguns dias no hospital, por isso tinham tempo de falar do resto.
- Tem uns golpes que formam letras – ÊL. Sabe o que querem dizer?
- Não.
- Não tem importância. Precisamos completar a sua ficha e avisar os seus familiares que está aqui. Depois poderá descansar e mais tarde falamos do resto. Diga-me, como se chama?
O médico olhou para a ficha e tirou uma caneta do bolso da bata, mas a rapariga não respondeu.
- Preciso mesmo saber o seu nome. – Encorajou-a o médico, sorrindo.
Ela limitou-se a olhar para o rapaz que segurava a sua mão.
- Ele disse que não a conhece. – Disse o médico.
Ela falou a medo, como se as palavras a magoassem.
- Não sei… Não me lembro de nada… Acordei na relva… Estava tanto frio… E depois ele disse que não ia magoar-me…
Ela ficou agitada, aterrorizada. Deixou de conseguir falar. Apertava a mão do rapaz com força e tremia.
O médico saiu do quarto. Voltou com uma seringa e introduziu o líquido no cateter do soro. Em poucos minutos, a rapariga voltou a adormecer.

- Por favor, não grite, está num hospital. E se lhe pedir, ela fala connosco. Agora se não se importa, preciso falar com alguns especialistas.
- Eu sei que chamou a polícia, também sei que esteve uma senhora da polícia científica com ela para recolher vestígios. É óbvio que esta rapariga foi torturada, basta olhar para a cara dela. Também me parece óbvio que foi violada, afinal eu via sangrar.
- Onde quer chegar com tudo isto?
- Quero ajudá-la, mas preciso que me diga como.
- Ela confia em si. Ajude-a a confiar em mais alguém. Afinal, com a vida que tem, não vai poder estar sempre cá e se desaparecer de repente ela pode não resistir.
- Porque confia ela em mim?
- Não sei bem. Talvez porque não se lembra de mais ninguém. Quando os especialistas chegarem pode falar com eles.
- Que tipo de especialistas? E especialistas em quê? Torturas, violações, amnésia?
- Psicólogos e psiquiatras. Vou ver quem está agora no hospital.
- Que se lixem os do hospital! Devem ter mais que fazer. Chame os melhores do país, doutor, os melhores! Dinheiro não é problema.

Voltou para o quarto, ela ainda dormia, devia dormir mais umas horas. O médico tinha razão, era preciso que ela confiasse em mais alguém. Era terça-feira e no sábado de manhã deviam partir para Lisboa. Tinha quatro dias. Mas quem podia chamar?
Talvez Andreas, o seu melhor amigo. Mas saberia ele lidar com a situação?
Ou então Liesel. Não, Liesel sempre fora muito impressionável.
E Franzi? Ele sempre se dera bem com Franzi, apesar de ela ser nove anos mais velha. Franzi sempre dissera que achava graça ao seu ar rebelde.
Franzi era sensível, não ficaria indiferente à história da rapariga. Franzi era forte, saberia apoiá-la sem se ir abaixo. Mas sobretudo, Franzi sempre tinha tido um olhar e um sorriso especiais – transmitiam confiança. Sim, ia pedir ajuda a Franzi.
Voltou a olhar para a jovem que dormia. Devia ser mais ou menos da idade de Franzi.
- Porque estou a ajudá-la? Não a conheço, não sei nada sobre ela. Talvez o Georg tenha razão, talvez seja porque parece uma donzela élfica. – Fez uma careta antes de sair do quarto para telefonar a Franzi. – Eu estou é a ficar afectado pelo cansaço. Imagine-se, uma donzela élfica. É apenas uma rapariga que alguém torturou.

Continua...
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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty Re: E se eu não quiser lembrar? #28 e 29

Mensagem  gwen Qui Jul 24, 2008 12:08 am

# 6


Andreas abriu o portão e deixou-nos entrar. Franzi bateu à porta.
Estávamos numa aldeia, não me pareceu muito grande. A casa era branca com grandes janelas que deixam entrar a luz. Tinha um pequeno jardim à frente e um maior atrás. Havia vários carros estacionados junto ao baixo muro do jardim. Era meio-dia e estava calor.
A porta abriu-se, uma senhora loura, de cabelo curto sorriu-nos.
- Franzi, Andreas, estava a ver que não chegavam, já cá estão todos. – Exclamou, dando dois beijos a cada um.
- Pois, vimos os carros. Peço desculpa pelo atraso, Simone, mas apanhámos algum trânsito. Onde está a Êl? Queríamos apresentar-lhe o Ve antes de entrarmos, que aí dentro deve estar uma confusão. – Franzi estava a ficar nervosa outra vez.
Simone parecia não me ter visto até então.
- Quem é? – Ouviu-se uma voz vinda de dentro.
- A tua irmã. Se tu e a Êl já prepararam todas as partidas para os outros três venham cá, que a Franzi e o Andreas têm uma surpresa para ela.
Antes de Simone ter terminado, Gustav já tinha saído de casa e abraçado a irmã.
- Tive saudades tuas, Franziska. Pensei que te ia encontrar ontem em casa do pai e da mãe.
- Ontem trabalhei até tarde no laboratório e depois achei melhor não conduzir cansada. Ah, e também tive saudades tuas. – Acrescentou a rir.
Sempre se tinham dado bem, por mais que implicassem um com o outro. É a Franziska que Gustav telefona quando se sente confuso e precisa que lhe digam se escolheu ou não o melhor caminho.
Gustav cumprimentou Andreas. Êl observava-os da porta, por trás de Simone. Disse apenas Olá, com um sorriso triste.
- Êl, este é o Ve. Fomos buscá-lo hoje a casa da minha amiga Natasha. Talvez te possa fazer companhia nas tuas caminhadas.
Êl gostava de andar pela aldeia, ao fim do dia, quando a noite se aproximava, mas tinha medo de ir sozinha. Simone desviou-se, para que ela pudesse sair sem lhe tocar. Aproximou-se de mim, baixou-se, olhou-me nos olhos, sorriu e fez-me festas na cabeça.
- É tão bonito.
- É teu. Se o quiseres, claro. – Disse Andreas a medo.
- A sério? Claro que quero. É tão fofo. – Disse abraçando-me.
- É tão grande. De que raça é? – Perguntou Simone.
- Um São Bernardo. – Explicou Franzi.
- Não sabia que os havia brancos.
- Não há. É albino, por isso tem o pelo todo branco e os olhos avermelhados. Foi por essa razão que ninguém o comprou, as pessoas acham-no esquisito. Já tem quase dois anos, faz no próximo mês. Uma vez um casal levou-o, mas tiveram de devolvê-lo, porque a filha de 10 anos fartou-se de berrar. Dizia ela que o Ve não é um São Bernardo a sério.
- Ve é um nome original. – Notou Êl, enquanto continuava a fazer-me festinhas atrás das orelhas.
- Sim, a Natasha gosta de dar nomes de antigos deuses aos seus animais. Ve é um antigo deus germânico. – Explicou Franziska com um encolher de ombros.
- Diz a lenda que foi Ve quem deu o dom da fala e da palavra aos homens. – Completou Êl. Os outros sorriram, já estavam habituados ao facto de Êl ter uma cultura geral assombrosa.
- Bem – interveio Simone – e se fossemos apresentar o Ve aos outros?
Jamais esquecerei aquele primeiro encontro com Êl. Franzi tinha razão, o seu olhar era sofrido. O seu sorriso era triste, muito triste.
A casa estava cheia. Como os rapazes vinham visitar Êl nesse fim-de-semana, Gordon decidiu convidar todos para um dia animado. Como Êl estava mais calma, todos concordaram que um sábado em espírito de festa lhe faria bem.
Mas a jovem ainda tinha medo quando via muita gente reunida, porque não podia controlar o movimento de todos. Assim, quando entrámos em casa, ela deu a mão a Gustav, para se sentir mais segura.
Estavam todos nas traseiras. Assim que aparecemos, Georg gritou:
- Franzi! Nunca fiquei tão feliz por te ver. – Dizia enquanto a abraçava. – Importaste de obrigar o teu irmão a portar-se como gente?
- Oh! Coitadinho do meu hobbitezinho. – Disse enquanto começava a distribuir beijos pelos outros. – O que foi que te fizeram?
- Me fizeram, não! Nos fizeram! Ele e a Êl passaram a manhã a pregar-nos partidas aos três.
- E posso saber o que é que os três lhes fizeram a eles?
- Nada! – Exclamou Bill indignado.
- Oh! Claro que não! Imagino! – Franziska falava em tom sarcástico, tentando conter o riso. – Afinal vocês são uns anjinhos.
- Todos aqui sabem que somos uns anjinhos, Fanny. Mas obrigado por os lembrares.
- Tom Kaulitz, voltas a chamar-me isso e ficas sem dentes! – Ameaçou. – E se fosse a ti não me mexia muito, tens as sapatilhas atadas uma à outra. – Atirou-lhe por cima do ombro enquanto se virava para cumprimentar os outros.
- Eu juro que gostava de saber como é que eles conseguem!
Todos riram. Todos menos Tom, Bill e Georg. Até Êl sorria abertamente por trás de Gustav.
- Francamente Andreas, pelo menos tu devias estar do nosso lado! – Reclamou Bill levando o seu copo à boca e cuspindo a bebida logo em seguida, o que provocou outro sorriso aberto em Êl.
Gustav virou-se para ficar de frente para ela.
- Conseguiste pôr-lhe alguma coisa no copo?
- Vinagre.
- Tu és genial. – Disse-lhe com um sorriso rasgado.
- Eu nunca mais vos falo! – Bradou Bill.
- Oh, por favor! Pelo menos faz uma ameaça credível! Tu jamais poderias cumprir isso, porque és incapaz de estar calado.
- Isso vindo de ti parece uma anedota. Falas tanto ou mais do que eu. E vê lá mas é se compões esses atacadores.
- Olha… – Avizinhava-se uma longa discussão entre os gémeos. Êl interveio.
- Vamos comer? Estou cheia de fome. – Não gostava de os ver discutir, ainda por cima por causa das suas partidas. E sabia que era a única que conseguia fazê-los parar, provavelmente não ia ser sempre assim, mas por enquanto funcionava.
A tarde estava quente, mas a casa estava fresquinha, por isso refugiei-me lá dentro. Estava a adormecer no chão fresco da cozinha, quando Franzi e Simone entraram.
- Mas aconteceu alguma coisa, Simone? Ela parece quase feliz, os rapazes fazem-lhe bem.
- Hoje levantei-me cedo, mais cedo que de costume. E como sempre fui ver se ela ainda dormia. Bem… Ela não estava sozinha… o Tom dormiu com ela…
- Pois, estou a ver. Sendo o Tom como é com raparigas, a Simone tem medo que ele a possa magoar.
- Sim Franziska, tenho. É óbvio que não aconteceu nada, nem ela continuaria a confiar nele se tentasse. Mas com o tempo, quando ela melhorar, tenho medo do que possa acontecer. E como tu acompanhaste a Êl quase desde o início, achei que podias falar com o Tom.
- Eu falo. Mas não acredito que ele a pudesse magoar. Já reparou como ele a olha? Faz-me lembrar o menino que era há uns anos atrás, quando o Gustav mo apresentou.
Simone sorriu. Ficaram a olhar-se, a recordar em silêncio o tempo em que os rapazes não passavam de quatro meninos com um sonho.

O silêncio foi cortado por uma voz vinda da sala.
- Ainda estás chateado? – Era Êl.
- Achas que alguém pode ficar chateado contigo quando sorris? Mas não voltes a roubar-me o eyeliner!
Simone e Franzi sorriram uma para a outra. Se até Bill, que era o mais casmurro, já tinha perdoado todas as partidas dessa manhã, então estava tudo bem.

continua...
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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty Re: E se eu não quiser lembrar? #28 e 29

Mensagem  Polly Qui Jul 24, 2008 1:13 am

Nao sabia que esta fic tambem estava neste forum :X
Eu estou a segui la no outro... e das melhores que ja li... AMO MESMO!! Very Happy

Eu ja comentei este capitulo no outro forum mas nao resisti comentar aqui... hehe


Beijinhos grandes*

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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty Re: E se eu não quiser lembrar? #28 e 29

Mensagem  gwen Sex Jul 25, 2008 11:45 pm

Polly escreveu:Nao sabia que esta fic tambem estava neste forum :X
Eu estou a segui la no outro... e das melhores que ja li... AMO MESMO!! Very Happy

Eu ja comentei este capitulo no outro forum mas nao resisti comentar aqui... hehe


Beijinhos grandes*

Tu és tão linda, que te deste ao trabalho de comentar isto nos dois fóruns.

beijos
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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty Re: E se eu não quiser lembrar? #28 e 29

Mensagem  gwen Sex Jul 25, 2008 11:51 pm

# 7


Sentiu passos, mas não ligou, de vez em quando passava alguém, um enfermeiro, um médico, um auxiliar… Felizmente o piso dos quartos privados era sossegado.
Êl tinha voltado a acordar pouco depois das 13 horas. Tentaram fazê-la comer, mas era-lhe doloroso. Esteve acordada cerca de meia hora, depois voltara a dormir.
Os passos estavam mais próximos. Estava sentado no chão do corredor, junto à porta entreaberta do quarto – assim daria conta se ela voltasse a acordar. Abraçava as pernas com os braços e apoiava a testa nos joelhos. Precisava descansar, dormir em condições, mas não podia deixá-la. Sentiu alguém aninhar-se junto a si.
- Tom? – Era Bill.
Abriu os olhos e levantou a cabeça devagar.
- Olha para ti. Estás de rastos, devias ir a casa dormir.
- Não posso deixá-la.
- Nós ficamos com ela. – Disse a voz de Gustav.
Tom levantou a cabeça, Georg também lá estava. Tom levantou-se, para que se afastassem ligeiramente da porta, e contou-lhes o que se tinha passado nessa manhã.
- Eu até sugeria que cancelássemos a viagem, se o festival fosse noutro lado. Mas é em Lisboa. Se não formos corremos o risco de ser apedrejados no dia do concerto, ou pior, ter o pavilhão vazio. Já cancelámos um concerto lá, não podemos voltar a fazer-lhes isso.
- Eu sei, Gustav. Foi por isso que telefonei à tua irmã. Ela vem amanhã, diz que pode ficar o resto da semana.
- Hum, Tom, achas que podemos vê-la hoje?
- Sim, Bill, acho que sim. Mas não façam barulho, nem movimentos bruscos. E se ela acordar, afastassem, mas devagar, porque os gestos repentinos assustam-na.
Entraram no quarto devagar, ela ainda dormia. Bill ficou chocado. Como era possível que alguém pudesse ter feito aquilo a outro ser humano. A cara de Êl parecia ter o dobro do tamanho normal e tinha uma tonalidade roxa-esverdeada, por causa dos hematomas. Para além disso tinha pequenos golpes infectados, como se não tivessem sido tratados.
Tom seguiu o olhar do irmão.
- Por favor, não a olhes assim quando acordar.
A rapariga mexeu-se, gemeu baixinho e finalmente abriu os olhos. Georg e Gustav deram um passo atrás, Tom aproximou-se e Bill desviou os olhos da sua cara, permanecendo junto à porta fechada. Reparava agora que ela tinha uma linha larga e negra nos pulsos, como se lhos tivessem amarrado. Sentiu vontade de bater em alguém – que tipo de gente podia ter feito aquilo?
Tom carregou num botão, fazendo levantar a cama ligeiramente, de maneira a que ela ficasse quase sentada. Depois começou a falar devagar, tinha medo da reacção dela.
- São amigos, vieram visitar-te... O Georg estava comigo na outra noite, foi ele que nos trouxe para o hospital. Aquele é o Gustav e o que está junto da porta é o imbecil do meu irmão mais novo.
Os rapazes sorriam, até Bill, que se atreveu a olhá-la de novo. Êl levantou o braço esquerdo e Tom pegou-lhe na mão. O silêncio instalou-se. Foi ela quem o quebrou.
- Porque estás a ajudar-me? – Olhava Tom nos olhos.
- Porque pareces uma donzela élfica. – A resposta veio de Georg.
- Que tipo de donzela élfica ficaria neste estado?
- Uma que tivesse sido raptada por Trolls das montanhas.
Os lábios da rapariga tremeram. Tom perguntou-se se aquilo seria uma tentativa de sorriso. Georg tinha conseguido acalmá-la, ela apertava-lhe a mão com menos força.
Voltou a olhá-lo nos olhos.
- Não sei o teu nome.
- Tom.
- Também não sei o meu.
Foi Gustav quem falou dessa vez, atrevendo-se a aproximar-se mais da cama.
- Devíamos dar-te um nome élfico. Isso deixaria o hobbit Georg feliz.
- Êl. – Todos fitaram Bill. A rapariga levou a mão direita ao antebraço esquerdo.
- Êl... – Repetiu a rapariga. – Sim, acho que pode ser.
Bill aproximou-se, parou junto do irmão.
- Devias ir a casa tomar um banho. – Disse dirigindo-se a Tom. – Cheiras mal.
Os lábios de Êl voltaram a tremer.
- Tenho sede.
Georg encheu um copo com água de uma jarra que havia numa pequena mesinha junto à cama e passou-lho, mas ela não lhe pegou, limitou-se a soltar a mão de Tom, que percebeu a apreensão dela. Tom tirou o copo da mão de Georg e então ela pegou-lhe com a mão esquerda.
- És esquerdina?
- Oh Tom! Francamente, isso lá é pergunta que se faça!
- Não, Bill, a sério, ela faz tudo com a mão esquerda.
- Se calhar, mas só se calhar, é porque tem o soro na mão direita.
As suas vozes estavam a subir de tom, iam discutir. Tom preparava-se para lhe responder.
- Não sei... – Olharam todos para Êl, que fitava o copo. – Não me lembro...
Voltou a instalar-se o silêncio. O que se pode dizer a alguém que perdeu a memória? Alguém que está no hospital porque foi torturada?
- Podemos descobrir. – Georg estava a ter uma das suas ideias destrambelhadas. – Bill, abre esse saco de viagem a que chamas mala e tira uma folha. Oh, vá lá, não olhes assim para mim, todos sabemos que andas sempre com um bloquinho atrás para o caso de te sentires subitamente inspirado.
- Vê lá se levas com o saco de viagem na testa! – Bill abriu a mala, tirou um caderninho com uma imagem dos quatro na capa e passou-o ao irmão.
- Bill?
- Sim, Georg!
- O teu lápis, ela vai precisar do teu lápis.
Êl tentou ajeitar-se melhor na cama, mas era doloroso mexer-se.
- O que tu precisas é de umas almofadas fofas. – Disse Tom enquanto se dirigia à porta do quarto. Abriu-a, deu um passo para fora, olhou para os dois lados do corredor, depois virou-se para a direita.
- Olhe, desculpe? – Começou a gritar. Gustav e Georg riam, Bill olhava para ele incrédulo, de boca aberta. Os lábios de Êl voltaram a tremer.
- Desculpe? Importa-se de me arranjar umas almofadas para o quarto 13? Mas que sejam fofinhas, que as costas da menina estão magoadas! – Voltou a entrar no quarto, fechando a porta devagar. Bill não se conteve.
- Tu estás maluco? Tens noção do barulho que fizeste?
- Qual barulho? Tive imenso cuidado a fechar a porta para não bater.
- Ele também fez isso hoje de manhã: primeiro grita no corredor, depois fecha a porta devagarinho para não fazer barulho. – Disse Êl na sua voz dolorosa.
Tom olhou-a. Tinha os cantos da boca ligeiramente contraídos, agora não tinha dúvidas – aquilo era uma tentativa de sorriso. Encolheu os ombros despreocupadamente.
- Estás bem instalada? – Georg falava com voz suave. – De certeza? Se quiseres mais almofadas o Tom pode dar mais uns berrinhos no corredor. Bem, então abre lá o caderno e pega no lápis.
Êl pegou-lhe com a mão esquerda.
- O que escrevo?
- Tokio Hotel.
- Ó Bill, mete lá isso no cu. – Disse Georg com uma careta. Depois voltou-se para Êl. – Escreve donzela élfica.
Êl escreveu. Depois pegou no lápis com a mão direita e voltou a escrever. Gustav aproximou-se mais, espantado.
- És ambidextra. Realmente ambidextra. Isso é raro.
Êl escrevera na perfeição com as duas mãos, apesar das dores nos pulsos e do soro nas costas da mão direita. A letra tinha inclinações diferentes, de acordo com a mão que tinha sido escrita, mas não havia dúvidas: ela era capaz de escrever com ambas as mãos.

Continua...
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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty E se eu não quiser lembrar? #8

Mensagem  gwen Seg Jul 28, 2008 12:31 am

# 8

Tom chegou cedo ao hospital. Tinha dormido em casa depois de prevenir Êl que Georg passaria ali a noite. Êl gostara dele. A sua personalidade destrambelhada parecia acalmá-la.
Bateu ao de leve na porta com o nº 13 e entrou. Êl dormia. Georg estava de pé, junto à janela a ver a chuva torrencial que caía lá fora.
- Bom dia Tom. Vieste cedo.
- Bom dia. Queria estar cá quando ela acordasse.
- Deve dormir até às 9h. Ontem, depois de ires embora, o médico disse que os sedativos deviam fazer efeito durante 12 horas. O que significa que ainda temos uma hora.
- Uma hora para quê?
- Vamos para o corredor, não a quero acordar.
Saíram deixando a porta entreaberta. Êl acordava sempre com um gemido, assim poderiam ouvi-la. Ficaram do outro lado do corredor, em frente à porta do quarto, a falar em sussurros.
- Tom, tu sabes quem ela é?
- Sabes bem que não Georg. Que raio de pergunta é essa? – Tom estava indignado com a estranha pergunta do amigo.
- Tem calma. Não quis ofender. Desculpa.
- Tens que admitir que foi uma pergunta no mínimo estranha, afinal tu estavas lá, foste o primeiro a vê-la, vieste connosco para o hospital.
- Nem me lembres. Foram horas horríveis. Só de pensar que o médico estava convencido que tínhamos sido nós a magoá-la.
- E a polícia? Eles foram à discoteca confirmar que estivemos lá. Felizmente não usaram os nossos nomes, limitaram-se a pedir para ver as gravações das câmaras de vigilância.
- E tinham mandato?
- Não, mas o gerente disse que não tinham nada a esconder e se era para ajudar a desvendar um crime tinham todo o prazer em colaborar.
- Melhor assim. Já pensaste se isso chegava à imprensa? Já estou a ver os títulos: Tokio Hotel acusados de agredir jovem.
- Nem me fales. O David matava-nos porque só nos metemos em sarilhos. O Saki matava-nos pela incursão na noite de Berlim sozinhos.
- Tom?
- Sim.
- O Saki já sabe. Estive com ele ontem.
- Ui! E?
- Bem, primeiro passou-se. Disse que podíamos pelo menos avisar para ele saber por onde andamos caso haja algum problema. Sabes como é, o discurso do costume.
- Se sei! Dois terços dos sermões do Saki são dirigidos a mim.
- Tu também estás sempre a fazer das tuas.
- Oh! Mas ele até gosta de nós.
- Se não gostasse já se tinha ido embora há muito tempo. Afinal, temos que admitir, nós não somos fáceis de aturar.
- A minha mãe diz que o Saki deve ser um anjo, com direito a asinhas e tudo.
- Porquê?
- Porque ela precisa de toda a sua paciência de reles mortal para nos aturar, a mim e ao Bill, e só somos dois. Para aturar os quatro juntos, só mesmo com paciência angelical.
Riram ambos.
- Depois falei ao Saki sobre a rapariga. – Continuou Georg. – Ficou tão impressionado com a história que me disse: Já estava na hora de um dos vossos disparates render bons frutos. Pediu para o avisarmos se puder ajudar em alguma coisa.
Ficaram em silêncio durante alguns minutos. O hospital estava calmo. Georg tinha um ar cansado, mas não parecia querer ir embora.
- Não sei como aguentaste passar aqui tanto tempo. Eu só cá passei uma noite e estou todo partido.
- Não podia deixá-la. – Tom fitava os pés, continuava com ar cansado e parecia triste.
- Tom?
- Sim? – Ergueu os olhos para fitar o amigo.
- Porquê? Porque estás aqui? Porque não podes deixá-la? Porque te preocupas tanto?
- Tu também estás aqui. Tu também te preocupas. Eras capaz de a abandonar? De a ter deixado simplesmente no hospital sem saberes se ia ficar bem? Conseguias deixá-la agora? Agora que sabes que está sozinha? Que não se lembra quem é?
Tom encostou-se à parede e suspirou. Parecia derrotado.
- Sabes bem que não. Mas, Tom… Tu… É diferente… Nunca te vi assim por causa de ninguém, a não ser pelo Bill.
Tom voltou a suspirar. Tinha os olhos fechados. Não falou. Georg percebeu que o amigo tinha dormido pouco e provavelmente mal. Ficaram em silêncio durante alguns minutos.
- Sabes que o Bill hoje não dormiu? – Tom mantinha os olhos fechados enquanto falava. – E acho que Gustav também não. Não me falou hoje, nem bom dia me disse.
Tom e Bill tinham apartamento em Berlim desde Abril, quando Bill tinha feito reabilitação das cordas vocais, depois de ser operado para remover um quisto. Gustav e Georg estavam a passar uns dias com eles, sempre era melhor do que ir para um hotel.
- E tu, – Tom abriu os olhos para encarar Georg. – pelo teu aspecto, também não dormiste. E sabes porquê? Sabes porque não dormiram? Nenhum de vocês?
Agora era Georg quem fitava os pés.
- Porque a imagem dela vos persegue. Não é Georg?
Georg não respondeu.
- Sempre que um de vós fecha os olhos, vê a cara dela: inchada, negra, cortada. O olhar dela persegue-vos. Aqueles belos olhos, que estão vazios, distantes, martirizados, aqueles olhos perseguem-vos. A incapacidade dela de sorrir magoa-vos. Saber que existe alguém lá fora, à solta, livre, que respira como nós, ri como nós, vive como nós, mas foi capaz de deixar uma rapariga neste estado, saber isso esmaga-vos, tira-vos o fôlego, a alegria, a capacidade de respirar normalmente…
Tom estava alterado, respirava com dificuldade, as lágrimas corriam-lhe pela cara. Georg aproximou-se do amigo e abraçou-o. Ficaram assim uns instantes. Choraram ambos.
Quando se separaram, Tom já não chorava, mas o seu olhar era triste, dorido.
- Queres saber porque não posso deixá-la? Vocês só a viram ontem. Eu olhei-a nos olhos naquela madrugada. Sabes o que vi? Vi a morte. Ela ia morrer, Georg. E sabia que ia morrer. Se tu não a tivesses visto a deambular pelo parque… Se eu não tivesse a mania de me atirar a tudo o que usa saias… Se não a tivéssemos trazido para o hospital… Ela tinha morrido naquele parque… Tinha-se esvaído em sangue…
Tom não chorava. Já não conseguia. O que sentia era demasiado forte para ser exprimido pelo choro. Tinha um nó na garganta… Um aperto no peito…
- Ela está sozinha, Georg. Não se lembra de ninguém, não conhece ninguém. Não sabe quem é. Só me tem a mim. Achas que posso deixá-la?


continua...


Este é o 8, que eu adoro, não só pelo conteúdo, mas também pela forma como foi escrito.
Quando projectei este capítulo era suposto a conversa entre o Tom e o Georg ser apenas um parágrafo, mas depois deixei-me levar pela cena e continuei a escrever.
O capítulo todo foi escrito de um folego só.
Só quando parei é que me apercebei da quantidade de texto que já tinha escrito e quando reli, pensei: Uau! de onde é que isto tudo saiu?
E pronto, adoro o 8...
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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty E se eu não quiser lembrar #9

Mensagem  gwen Qua Jul 30, 2008 11:50 pm

# 9


Êl e Bill entraram na cozinha. Êl dirigiu-se a Franzi e deu-lhe um pequeno beijo na face direita.
- Obrigada, Fran. Pelo Ve.
- Oh! – Fran estava surpreendida, era a primeira vez que Êl lhe tocava. – A ideia foi do Andreas. Na última vez que cá estivemos ele disse que gostava de te oferecer um cão e eu lembrei-me do Ve. Telefonei à Natasha e hoje fomos buscá-lo. Tive que me levantar cedo, mas valeu a pena.

Franzi visitava Êl mais de uma vez durante a semana e sempre aos domingos. Normalmente passava por Magdeburg e trazia mais alguém com ela. Na quinta-feira anterior tinha sido Andreas e Liesel. Quando chegaram, Êl brincava no jardim com Scooty, o cão de Bill. Franzi tinha passado em casa dos pais e trazia Bruno, que começou a abanar a cauda assim que viu Êl.
- Um dia destes o Gustav vai começar a sentir ciúmes, o cão dele gosta quase tanto de ti como dele. – Disse Liesel enquanto entrava no jardim. Êl sorriu, os seus sorrisos eram cada vez mais frequentes.
- Olá. A Simone e o Gordon ainda não voltaram, estou sozinha. Mas podemos entrar, eu faço chá e também há bolo de chocolate quentinho, mas não sei se está bom. Fui eu que fiz, segui uma receita da Simone.
- O bolo estava muito bom. – Liesel falava devagar, tinha sono, haviam demorado mais do que deviam. – Não a acharam mais animada hoje?
- Sim, estava. – Andreas respondeu à irmã também com voz sonolenta. – Os rapazes chegam amanhã e só por saber que eles vêm, ela já fica mais animada.
- Às vezes acho que ela ainda tem medo de nós. – Liesel tentava combater o sono, sentia-se embalar pelo movimento do carro.
- Não é que tenha medo. – Franzi também tinha sono, nessa noite ia dormir em casa dos pais. Preferia levantar-se de manhã mais cedo do que arriscar-se a adormecer ao volante. – Mas não se sente completamente segura. Para ela existe o antes e o depois de ter acordado naquele quarto de hospital. E antes há apenas a ameaça da dor, da tortura. Ela não se lembra, mas sabe que está lá. E há o Tom. No seu inconsciente é como se o Tom a tivesse libertado, por isso com ele está segura.
- Devíamos oferecer-lhe um cão, Franzi.
- Porquê um cão, Andreas?
Liesel tinha adormecido.
- Porque ela os adora e eles também parecem gostar dela, até o da vizinha dos teus pais. Lembraste quando ela esteve em vossa casa? O raio do cão não suporta pessoas, mas com ela estava super calmo.
- Ve!
- Desculpa?
- A minha amiga Natasha tem um cão especial chamado Ve. Amanhã telefono-lhe, acho que posso ir buscá-lo sábado de manhã.
- Posso ir contigo?
- Podes, venho buscar-te. Mas tem que ser cedo, ainda é longe.


Mais tarde, Êl agradeceu a Andreas, mas não lhe tocou, ainda era cedo.


- Mãe?
- Sim Bill.
- Não disseste que tinhas feito o meu bolo preferido? – Perguntou enquanto passava o olhar pela cozinha, de sobrolho levantado.
- Êl? O que é que tu e o Gustav fizeram ao bolo?
- Nada, Simone. – Êl sorria abertamente. – Nós só o escondemos um bocadinho. Se o Bill o quiser vai ter que o encontrar.
- Vocês os dois juntos são impossíveis! – Bill saiu a bufar.
- Fran, devias ir lá fora ver o teu pai.
- O que é que vocês fizeram ao meu pai?
- Nós nada. Foi a tua mãe. Disse ao Hagen que ele tem andado com uma dor num dente e agora estão todos a tentar convencê-lo a passar pelo consultório para ver o que é.
- Isso é digno de se ver. – Disse Simone saindo.

De facto a cena nas traseiras era digna de se ver.
Tom, Georg, Gustav, Andreas e Mark riam a um canto. Liesel explicava a Bill o que se estava a passar e Hans falava, tentando conter o riso.
- Então Wolfgang, é só uma ida ao dentista. E depois, é o Hagen, que mal é que ele lhe pode fazer?
- Tu por acaso já foste ao dentista? Já viste a quantidade de instrumentos de tortura que eles têm?
- Oh Wolfgang, por favor…
- E tu cala-te Angela, já disseste que chegue por hoje!
- Wolfgang, amigo…
- É melhor estares calado, Gordon.
- Não vejo porquê Ilsa.
- Depois não digas que não avisei.
- Amigo, – Disse Gordon, voltando-se novamente para Wolfgang. – não achas que já estás demasiado crescidinho para teres medo de médicos?
- Achas Gordon? E tu, não? Ou já não te lembras que foi a mim que telefonaste há três meses atrás? Lembraste? Quando tive que te levar pela mãozinha até ao urologista?
Depois disto todos riam, não só de Wolfgang, mas também de Gordon.
- Eu avisei-te Gordon.
- Oh Ilsa está calada! – Gordon corara. Fora Ilsa quem lhe arranjara a consulta, por isso já conhecia a história.

- Hey, Bill?
- Sim, Êl.
- Tu não tinhas um bolo para ir procurar?
- Ai que raiva!
- Que bolo?
- Oh Tom, o que a mãe fez, eles esconderam-no!
- Pois escondemos. – Gustav fugiu para trás de Êl. Ali estava a salvo da fúria dos outros. – E se o quiserem comer vão ter que o encontrar.
- Eu adoro os bolos da Simone…
- Oh hobbit, então mexe esse rabo mal-cheiroso e ajuda a procurar. – Tom entrou em casa, seguido de Bill, Georg, Andreas, Liesel, Mark e Hans. A busca tinha começado.


Continua...
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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty Adoooreii exe kapitulo , fazes uma imagem bue fofa do tom , ele ta bastante realista vamos disser assim...adoreii , sinceramente exa tbmm eh a mnha preferiida;

Mensagem  thalitaa Sex Ago 01, 2008 9:00 pm

Very Happy
gwen escreveu:
# 8

Tom chegou cedo ao hospital. Tinha dormido em casa depois de prevenir Êl que Georg passaria ali a noite. Êl gostara dele. A sua personalidade destrambelhada parecia acalmá-la.
Bateu ao de leve na porta com o nº 13 e entrou. Êl dormia. Georg estava de pé, junto à janela a ver a chuva torrencial que caía lá fora.
- Bom dia Tom. Vieste cedo.
- Bom dia. Queria estar cá quando ela acordasse.
- Deve dormir até às 9h. Ontem, depois de ires embora, o médico disse que os sedativos deviam fazer efeito durante 12 horas. O que significa que ainda temos uma hora.
- Uma hora para quê?
- Vamos para o corredor, não a quero acordar.
Saíram deixando a porta entreaberta. Êl acordava sempre com um gemido, assim poderiam ouvi-la. Ficaram do outro lado do corredor, em frente à porta do quarto, a falar em sussurros.
- Tom, tu sabes quem ela é?
- Sabes bem que não Georg. Que raio de pergunta é essa? – Tom estava indignado com a estranha pergunta do amigo.
- Tem calma. Não quis ofender. Desculpa.
- Tens que admitir que foi uma pergunta no mínimo estranha, afinal tu estavas lá, foste o primeiro a vê-la, vieste connosco para o hospital.
- Nem me lembres. Foram horas horríveis. Só de pensar que o médico estava convencido que tínhamos sido nós a magoá-la.
- E a polícia? Eles foram à discoteca confirmar que estivemos lá. Felizmente não usaram os nossos nomes, limitaram-se a pedir para ver as gravações das câmaras de vigilância.
- E tinham mandato?
- Não, mas o gerente disse que não tinham nada a esconder e se era para ajudar a desvendar um crime tinham todo o prazer em colaborar.
- Melhor assim. Já pensaste se isso chegava à imprensa? Já estou a ver os títulos: Tokio Hotel acusados de agredir jovem.
- Nem me fales. O David matava-nos porque só nos metemos em sarilhos. O Saki matava-nos pela incursão na noite de Berlim sozinhos.
- Tom?
- Sim.
- O Saki já sabe. Estive com ele ontem.
- Ui! E?
- Bem, primeiro passou-se. Disse que podíamos pelo menos avisar para ele saber por onde andamos caso haja algum problema. Sabes como é, o discurso do costume.
- Se sei! Dois terços dos sermões do Saki são dirigidos a mim.
- Tu também estás sempre a fazer das tuas.
- Oh! Mas ele até gosta de nós.
- Se não gostasse já se tinha ido embora há muito tempo. Afinal, temos que admitir, nós não somos fáceis de aturar.
- A minha mãe diz que o Saki deve ser um anjo, com direito a asinhas e tudo.
- Porquê?
- Porque ela precisa de toda a sua paciência de reles mortal para nos aturar, a mim e ao Bill, e só somos dois. Para aturar os quatro juntos, só mesmo com paciência angelical.
Riram ambos.
- Depois falei ao Saki sobre a rapariga. – Continuou Georg. – Ficou tão impressionado com a história que me disse: Já estava na hora de um dos vossos disparates render bons frutos. Pediu para o avisarmos se puder ajudar em alguma coisa.
Ficaram em silêncio durante alguns minutos. O hospital estava calmo. Georg tinha um ar cansado, mas não parecia querer ir embora.
- Não sei como aguentaste passar aqui tanto tempo. Eu só cá passei uma noite e estou todo partido.
- Não podia deixá-la. – Tom fitava os pés, continuava com ar cansado e parecia triste.
- Tom?
- Sim? – Ergueu os olhos para fitar o amigo.
- Porquê? Porque estás aqui? Porque não podes deixá-la? Porque te preocupas tanto?
- Tu também estás aqui. Tu também te preocupas. Eras capaz de a abandonar? De a ter deixado simplesmente no hospital sem saberes se ia ficar bem? Conseguias deixá-la agora? Agora que sabes que está sozinha? Que não se lembra quem é?
Tom encostou-se à parede e suspirou. Parecia derrotado.
- Sabes bem que não. Mas, Tom… Tu… É diferente… Nunca te vi assim por causa de ninguém, a não ser pelo Bill.
Tom voltou a suspirar. Tinha os olhos fechados. Não falou. Georg percebeu que o amigo tinha dormido pouco e provavelmente mal. Ficaram em silêncio durante alguns minutos.
- Sabes que o Bill hoje não dormiu? – Tom mantinha os olhos fechados enquanto falava. – E acho que Gustav também não. Não me falou hoje, nem bom dia me disse.
Tom e Bill tinham apartamento em Berlim desde Abril, quando Bill tinha feito reabilitação das cordas vocais, depois de ser operado para remover um quisto. Gustav e Georg estavam a passar uns dias com eles, sempre era melhor do que ir para um hotel.
- E tu, – Tom abriu os olhos para encarar Georg. – pelo teu aspecto, também não dormiste. E sabes porquê? Sabes porque não dormiram? Nenhum de vocês?
Agora era Georg quem fitava os pés.
- Porque a imagem dela vos persegue. Não é Georg?
Georg não respondeu.
- Sempre que um de vós fecha os olhos, vê a cara dela: inchada, negra, cortada. O olhar dela persegue-vos. Aqueles belos olhos, que estão vazios, distantes, martirizados, aqueles olhos perseguem-vos. A incapacidade dela de sorrir magoa-vos. Saber que existe alguém lá fora, à solta, livre, que respira como nós, ri como nós, vive como nós, mas foi capaz de deixar uma rapariga neste estado, saber isso esmaga-vos, tira-vos o fôlego, a alegria, a capacidade de respirar normalmente…
Tom estava alterado, respirava com dificuldade, as lágrimas corriam-lhe pela cara. Georg aproximou-se do amigo e abraçou-o. Ficaram assim uns instantes. Choraram ambos.
Quando se separaram, Tom já não chorava, mas o seu olhar era triste, dorido.
- Queres saber porque não posso deixá-la? Vocês só a viram ontem. Eu olhei-a nos olhos naquela madrugada. Sabes o que vi? Vi a morte. Ela ia morrer, Georg. E sabia que ia morrer. Se tu não a tivesses visto a deambular pelo parque… Se eu não tivesse a mania de me atirar a tudo o que usa saias… Se não a tivéssemos trazido para o hospital… Ela tinha morrido naquele parque… Tinha-se esvaído em sangue…
Tom não chorava. Já não conseguia. O que sentia era demasiado forte para ser exprimido pelo choro. Tinha um nó na garganta… Um aperto no peito…
- Ela está sozinha, Georg. Não se lembra de ninguém, não conhece ninguém. Não sabe quem é. Só me tem a mim. Achas que posso deixá-la?


continua...


Este é o 8, que eu adoro, não só pelo conteúdo, mas também pela forma como foi escrito.
Quando projectei este capítulo era suposto a conversa entre o Tom e o Georg ser apenas um parágrafo, mas depois deixei-me levar pela cena e continuei a escrever.
O capítulo todo foi escrito de um folego só.
Só quando parei é que me apercebei da quantidade de texto que já tinha escrito e quando reli, pensei: Uau! de onde é que isto tudo saiu?
E pronto, adoro o 8...
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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty E se eu não quiser lembrar? #10

Mensagem  gwen Sex Ago 01, 2008 10:27 pm

# 10

Tom observava Êl a dormir. Depois de se acalmar, Georg tinha partido. Passara a cara por água fria, não queria que ela percebesse que tinha chorado.
Já passava das 9 horas e Êl continuava a dormir.
A porta abriu-se. Era o Dr. Kafka. Alguém devia ensinar-lhe a bater à porta.
- Ela ainda não acordou?
- Como vê. Se calhar abusaram nos sedativos. – A voz de Tom era fria.
- Tivemos mesmo de lhos administrar, como viu não havia outra solução. – O médico consultou o relógio, eram quase 9h30, parecia preocupado.
Êl mexeu-se, soltou um pequeno gemido e abriu os olhos. Viu o médico a olhá-la do fundo da cama, depois procurou Tom. Não lhe estendeu o braço.
- Não ias dormir a casa?
- E fui. Já voltei. Queria estar cá quando acordasses.
- Mudaram-me os pensos! – Êl proferiu aquilo em tom de acusação enquanto alternava o olhar entre o médico e o seu antebraço esquerdo. – Puseram-me a dormir!?
- Teve que ser. – Explicou o Dr. Kafka. Êl olhou para Tom. – O seu amigo não queria, mas ele não é médico. Teve mesmo que ser, não havia outra solução, a Êl estava demasiado agitada, podia ter-se magoado a si própria.
Êl levantou o braço esquerdo, Tom aproximou-se e pegou-lhe na mão.
- Como se sente hoje? – Perguntou-lhe o médico.
- Na mesma.
- Vou pedir que lhe tragam leite e torradas. Se conseguir comer podemos tirar-lhe o soro por umas horas.
Dr. Kafka saiu e Êl tentou sentar-se.
- Tenho de ir à casa de banho.
Tom ajudou-a a levantar-se, acompanhando-a à casa de banho, esperou à porta. Quando saiu, Êl tinha os olhos cheios de água. Tom olhou-a preocupado.
- Dói! – Gemeu ela.
Por momentos, Tom achou que ela ia chorar, mas não chorou. Era incrível a resistência que ela parecia ter à dor. Tom ajudou-a a voltar para a cama, para comer. Bebeu o leite todo e comeu mais de metade das torradas, pelo que lhe tiraram o soro.
Êl estava encostada às almofadas. Tom tinha de falar com ela, mas precisava ganhar coragem, não podia deixar nenhuma lacuna, de maneira a que ela não se sentisse abandonada.
- Êl?
- Sim.
- Hoje vem cá uma pessoa. Uma amiga. Alguém em quem eu confio muito e que quer ajudar. Alguém que seria incapaz de fazer mal a quem quer que fosse.
- O psiquiatra disse que quer ajudar…
- Ah, pois… o Dr. Hoffman… - Bolas, aquilo não tinha começado da melhor maneira. Porque havia ela de lembrar-se do raio do psiquiatra? Ele tinha lá estado na tarde anterior.
Depois de Gustav afirmar que ela era ambidextra, Êl fechou o caderno e ficou a olhar para a capa. A porta abriu-se – o Dr. Kafka voltara a entrar sem bater. Tom ignorou-o, Êl também.
- Spring Nicht. É uma música vossa, não é? – Perguntou Êl.
- Sim, Êl, é nossa. – Tom estava perplexo. - Como sabes?
Êl encolheu os ombros.
- Cultura geral. – Era o médico quem falava. – É normal nos amnésicos: esquecem o que se relaciona com eles, mas lembram-se de coisas de cultura geral.
- Gosto de Spring Nicht. É bonita. – Êl continuava a fitar o caderno.
- Contactei o melhor consultório de terapeutas que conheço, como me pediu. – O médico dirigia-se a Tom. – O Dr. Ludwig Hoffman ficou de passar por cá dentro de uma hora. Preveni-o que não conseguiria falar com a paciente a sós.
- Êl. Decidimos tratar-me por Êl. – Ela fitava o médico.
- Muito bem, Êl, dentro de uma hora chega o Dr. Hoffman, eu gostava muito que falasse com ele, trata-se de um dos mais conceituados psiquiatras do país, acho que pode ajudá-la.
Êl olhou para Tom.
- Estaremos à espera. – Tom falou para o médico e depois voltou-se para Êl. – Está tudo bem, eu fico contigo, ele vem ajudar.
Durante uma hora, Êl ouviu-os falar da banda e de como o ano estava a ser mais calmo do que previsto, por causa do quisto que Bill contraíra nas cordas vocais.
Também falaram dos países por onde já tinham passado. Êl parecia conhecer todos os dirigentes dos países da Europa. Considerava a chanceler alemã uma mulher de fibra, mas não suportava o presidente francês.
Depois, o Dr. Hoffman chegou. A conversa com ele, na opinião de Tom, tinha sido um verdadeiro desastre.
- Devia falar a sós consigo. – Começara Dr. Hoffman.
- Não.
- Devo falar-lhe do seu diagnóstico.
- Fale. Ele pode ouvir.
- Muito bem. Já lá vamos. Sempre que falar consigo vou redigir um relatório que apresentarei à minha equipa. Juntos estudaremos o seu caso para tentarmos perceber qual o melhor método a utilizar para a ajudarmos a recuperar a memória, a lembrar-se quem é.
- E se eu não quiser lembrar?
- Nesse caso, podemos ajudá-la a perder o medo.
Êl não respondeu. Não tinha medo. Não quando estava com Tom.
- Devíamos dar-lhe um nome. Consegue pensar em algum?
- Tenho mesmo de falar com ele? - Perguntou a Tom.
- Se preferir posso falar com o seu amigo.
Êl não falou. Acenou com a cabeça.
- Resolvemos chamar-lhe Êl. Ela concordou.
Tom contou ao psiquiatra sobre a conversa dessa tarde.
- Sim, o doutor Kafka tem razão, os amnésicos costumam lembrar-se de assuntos de cultura geral. É bom terem esse tipo de conversas, se algum dos assuntos se aproximar da vida dela pode ajudá-la a lembrar.
- E se eu não quiser lembrar? – Êl fitava o médico. – Podemos falar do meu diagnóstico? O resto pode esperar.
- Muito bem. As suas análises ao sangue ficaram prontas. Foram-lhe administrados vários tipos de medicamentos nos últimos tempos: sedativos, antibióticos… Parece que estavam a tentar mantê-la viva a todo o custo.
"Perdeu muito sangue, por isso tem uma ligeira anemia, mas não é preocupante.
"Em relação aos seus golpes, alguns devem ter duas semanas, nenhum foi tratado, por isso tem algumas infecções graves, sobretudo nas costas.
"Mas há mais…
Havia um motivo para ser o psiquiatra a dizer-lhe tudo aquilo – os médicos temiam a reacção de Êl. Mas ela aguentou tudo. Tom ficou mais uma vez impressionado com a sua capacidade de suportar a dor. Êl não chorou. Limitou-se a apertar a mão de Tom com força.
Quando o psiquiatra finalmente se calou, Êl fitou Tom.
- Não chores. Eu estou bem agora. Agora já ninguém me pode magoar. Tu não vais deixar. – Êl falava com calma, pausadamente. Cada palavra era como mais um golpe que se abria na sua carne.
As lágrimas continuavam a correr pela face de Tom, sem que ele as conseguisse controlar. Êl esperou que ele se acalmasse, depois voltou a falar.
- Ninguém tem que saber. Ninguém vai saber tudo. Eu não quero. Só precisam saber o que vêem – os hematomas, os golpes… O resto não. Eu não quero que saibam. Ninguém.
Tom concordou. O psiquiatra também.


Continua...

Espero que tenham gostado.
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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty E se eu não quiser lembrar? #11

Mensagem  gwen Seg Ago 04, 2008 12:07 am

# 11

- Não, Êl, não é o psiquiatra.
- É alguém que te vem substituir.
- Substituir não.
- Tom, eu sei que tens de ir embora. Percebi isso quando vi o caderno do teu irmão ontem. Mas eu fico bem, se me prometeres que vens ver-me quando puderes.
- Eu prometo, mas gostava que conhecesses a Franziska. Ela não vem substituir-me, vem apenas fazer-te companhia. Eu vou estar sempre cá. Vou deixar-te um telemóvel e telefono-te todos os dias, sempre que puder.
Êl tinha medo. Não queria que ele a deixasse. Mas não podia pedir-lho. Ele já tinha feito tanto…
Êl tinha uma ideia vaga de quem eram os Tokio Hotel: quatro jovens alemães que haviam conquistado a Europa.
No dia anterior os quatro haviam falado do seu trabalho. Passaram o mês de Maio nos Estados Unidos e no Canadá e regressaram à Alemanha para receber os Comet Awards. Estavam nomeados para três categorias, mas ganharam quatro prémios. Queriam dar um aos fãs, tinham lançado um concurso para todos os países. Não acho justo. – Dissera Êl. – A Alemanha é o vosso país, foi aqui que tudo começou. É aqui que estão os vossos fãs mais antigos. Devia ser alguém da Alemanha a receber o primeiro prémio que vocês decidem entregar aos fãs.
- Tom?
- Sim.
- Quando vais?
- Sábado.
- Que dia é hoje?
- 28 de Maio, quarta-feira.
Êl não falou e Tom deixou o silêncio instalar-se. Ficaram assim cerca de 15 minutos, até que Êl voltou a olhá-lo nos olhos. O contacto visual parecia ser importante para ela.
- A tua amiga é médica?
- Não. É fotógrafa.
- Fotógrafa de quê?
- De tudo um pouco. Mas prefere a natureza, os animais. Já trabalhou com a BBC e a National Geographic. Já esteve em sítios que não lembram a ninguém, tipo aldeias remotas, ilhas desertas, florestas tropicais, desertos… Sei lá. Este ano ainda não saiu da Alemanha, diz que lhe apetece redescobrir o seu país. Tem estado a trabalhar sobretudo com instituições de Magdeburg.
- Magdeburg?
- Sim, nós somos de lá. A minha mãe vive numa aldeia chamada Loitsche. Os pais do Gustav e a mãe do Georg vivem nos arredores da cidade. A Franziska vive numa pequena cidade vizinha, chamada Barleben.
- Que idade tem a Franziska?
- Porque perguntas? – Tom estava confuso.
- Pelo que dizes é mais velha do que tu. Deves ter o quê? 19/20 anos? Ela tem que ter mais. Como a conheceste?
- Tenho 18. A Franziska tem 27. É irmã do Gustav.
Êl desviou o olhar. Encostou a cabeça nas almofadas e fechou os olhos. Parecia estar a pensar.
- Magdeburg… – Murmurou.
Tom ficou rígido – estaria ela a recordar algo?
Êl voltou a fitá-lo.
- Não foi lá que os restos mortais de Hitler foram definitivamente destruídos?
- De que estás tu a falar?
- Oh! É uma longa história… E não recordo os pormenores.
Mas Êl parecia mais descontraída e isso agradava a Tom, por isso decidiu que talvez fosse boa ideia ela contar a história.
- Tenho tempo. Hoje não vou a lado nenhum e os pormenores não interessam. – Disse-lhe com um sorriso.
Era a primeira vez que Êl o via sorrir. Tinha um sorriso bonito, parecido com o do irmão.
- Quando Hitler percebeu que estava encurralado – começou Êl – suicidou-se no seu bunker. Mas, durante anos, o seu fim foi uma incógnita. Só depois de a URSS cair e a Rússia começar a "abrir-se" ao mundo é que a história toda se soube.
Êl falava com calma. De vez em quando contraía os olhos, como se recordasse algo. Tinha um copo de água na mão direita e quando sentia a garganta seca bebi em pequenos goles.
- O exército russo foi o primeiro a chegar a Berlim e encontraram o bunker e os restos mortais de Hitler. Mas Estaline deu ordens para que essa informação não fosse divulgada. Quando o exército norte-americano entrou finalmente na parte de Berlim controlada pelos russos, não havia vestígios de Hitler, nem do seu paradeiro.
"Nos anos seguintes, Estaline utilizou essa informação a seu favor. Os Estados Unidos tinham saído da guerra poderosos. A Europa estava dizimada, as baixas foram enormes e havia a questão do Holocausto. A escalada dos Estados Unidos para o topo era inevitável. Mas Estaline não pretendia deixar o caminho livre.
"Começaram a surgir rumores de que Hitler poderia estar vivo. Rumores que foram encorajados por Estaline e até começados por ele. E apareceram histórias que pareciam sustentar esses rumores.
"No último dia de confrontos em Berlim, surgiu na avenida principal um pequeno avião e, sob os olhares incrédulos dos soldados, conseguiu descolar. Quando os rumores surgiram, muitas pessoas acreditavam que o próprio Hitler ia naquele avião.
"Também havia a história de um submarino alemão… Não me lembro bem… O submarino rendeu-se algum tempo depois de a guerra acabar… Surgiu o rumor que Hitler teria fugido no submarino e que estava algures num país da América do Sul… Não me lembro qual…
Êl calou-se, voltou a fechar os olhos.
- Não me lembro… – murmurou – Bem, não interessa. Existia a dúvida. Poderia Hitler estar vivo? Se sim, onde? Se não, onde estava o corpo?
"Depois Estaline lançou um novo rumor: Hitler estava vivo graças à protecção europeia – havia países europeus a protegê-lo. Podes imaginar a confusão, de repente os aliados começaram a desconfiar uns dos outros.
"A URSS ficou cada vez mais poderosa, os Estados Unidos também. A guerra-fria instalou-se. A Europa, corroída pela dúvida, a insegurança e a desconfiança, ficou no meio.
"Mas isso não interessa. Estou a desviar-me do assunto: os restos mortais de Hitler.
"O crânio seguiu para Moscovo e foi analisado. A ficha dentária de Hitler era conhecida e não restavam dúvidas de que aquele era mesmo o crânio do ex-ditador.
"O resto do corpo foi metido numa caixa e confiado ao líder de uma companhia do exército. A URSS manteve homens durante vários anos na Alemanha de Leste e os restos mortais de Hitler vaguearam por lá. Sempre que a companhia mudava de instalações, a caixa era desenterrada e levada, voltavam a enterrá-la no novo local em que se instalassem.
"Até que, finalmente, veio ordem de Moscovo para que a Alemanha fosse abandonada e os restos de Hitler destruídos. A caixa foi incinerada e as cinzas deitadas ao rio. Isto foi em Magdeburg.
"Claro que tudo só se soube quando os arquivos do KGB foram abertos ao ocidente. Acho que o crânio do Hitler ainda lá está.
- Uau, as coisas que tu sabes… – Tom estava impressionado.
- Oh! A história está cheia de lacunas e incongruências e nem me lembro das datas.
Êl recostou-se nas almofadas e fechou os olhos, parecia exausta, não estava habituada a falar durante tanto tempo.
Tom ficou a observá-la. Tinha diante de si uma jovem que alguém torturara, que não sabia quem era, mas parecia ter uma cultura geral excepcional.
Era quase meio-dia. Sentiram uma batida leve na porta que se abriu em seguida…



Continua...


Espero não ter cometido nenhum atentado à História Universal.
Do pouco que sei, o que escrevi sobre o Hitler é real.
Se não for, peço desculpa.
beijos
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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty Re: E se eu não quiser lembrar? #28 e 29

Mensagem  _Sara_ Ter Ago 05, 2008 7:27 pm

Bem minha Gwe'zinha ... Mi ir tentar fazer um comentário muiito gandiiii
para compensar aquilo que eu não comentei .... Ou seja ... Muiiitos capítulos E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 572223

Tenho-te a pedir imensas desculpas por isso E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 840573 Desculpa chiiim E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 389312
Bem Gwen mi vai passar ao capítulo .... Se calhar devia esperar pelo de hoje ... Mas mesmo assim ... Acho que vou comentar tu mereces tanto E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 269867

Bem ....



Capítulo 9


(vou começar pelo 9 foi onde eu deixei de ler ...
Sei que não foi onde eu deixei de comentar ... mas depois ...
Fica um comentário que se torna uma seca de ler +.+)



- Mãe?
- Sim Bill.
- Não disseste que tinhas feito o meu bolo preferido? – Perguntou enquanto passava o olhar pela cozinha, de sobrolho levantado.
- Êl? O que é que tu e o Gustav fizeram ao bolo?
- Nada, Simone. – Êl sorria abertamente. – Nós só o escondemos um bocadinho. Se o Bill o quiser vai ter que o encontrar.
- Vocês os dois juntos são impossíveis! – Bill saiu a bufar.


Bem estes dois juntos dão conta do pessoal todo ... mal algo de estranho aconteça é logo a eles que se pergunta algo ....
DUPLA INFALIVEL ÊL E GUSTAV!!
Amo Gwen =)


- Hey, Bill?
- Sim, Êl.
- Tu não tinhas um bolo para ir procurar?
- Ai que raiva!
- Que bolo?
- Oh Tom, o que a mãe fez, eles esconderam-no!
- Pois escondemos. – Gustav fugiu para trás de Êl. Ali estava a salvo da fúria dos outros. – E se o quiserem comer vão ter que o encontrar.
- Eu adoro os bolos da Simone…
- Oh hobbit, então mexe esse rabo mal-cheiroso e ajuda a procurar. – Tom entrou em casa, seguido de Bill, Georg, Andreas, Liesel, Mark e Hans. A busca tinha começado.


Êl bate-lhes todas ... Adoro esta rapariga sabe
mesmo cmo faz a coisa xD Espectacular a relação
que ela tem com os TH =)


[b]Capítulo 10
- Ela ainda não acordou?
- Como vê. Se calhar abusaram nos sedativos. – A voz de Tom era fria.
Como ele se preocupa ... Penso que
apesar de tudo eles no fim não vão ser mais do que meros
amigos .. mas isos é deixar passar e ver o que vai sair dessa cabecinha
que é uma autêntica caixinha de surpresas *.*
Tom ajudou-a a levantar-se, acompanhando-a à casa de banho, esperou à porta. Quando saiu, Êl tinha os olhos cheios de água. Tom olhou-a preocupado.
- Dói! – Gemeu ela.
Apesar da dor ela é forte ... Ainda não chorou ... Faz-me lembrar alguém ...
E penso que não é uma coisa que se vai ver muito :\
Mas que coisa Gwen ... deixas-me num estado imenso
de curiosidade.
Devia falar a sós consigo. – Começara Dr. Hoffman.
- Não.
- Devo falar-lhe do seu diagnóstico.
- Fale. Ele pode ouvir.
- Muito bem. Já lá vamos. Sempre que falar consigo vou redigir um relatório que apresentarei à minha equipa. Juntos estudaremos o seu caso para tentarmos perceber qual o melhor método a utilizar para a ajudarmos a recuperar a memória, a lembrar-se quem é.
Caramba Gwen ... A relação deles é querida ...
A confiança que ela tem nele é imensa ... E o facto de não puder
nestecaso não querer estar com ninguém sem ele estar a seu lado
opá faz qualquer um pensar de como é possível algo assim existir ...

- E se eu não quiser lembrar?
Esta palavra ... Esta palavra é uma das preciosas
palavras chave desta história ... Ou será que me engano?
Pôh Gwen tens que pô-la a querer relembrar-se desses momentos do
passado ... Não do mal mas sim do bom que ela passou nesse passado
que tão longinquou parece E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 328705
Mas há mais…
Há MAIS? CARAÇAS GWEN PORQUE NÃO MOSTRAS-TE O QUE HAVIA DE MAIS NESSA HISTÓRIA GWEEENNNNN AÍ QUE ME MATAS PORRA ACHAS BEM? EU DOU-TE PORRADA VIRTUAL GWEN AÍ DOU DOU!! E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 595846
Havia um motivo para ser o psiquiatra a dizer-lhe tudo aquilo – os médicos temiam a reacção de Êl. Mas ela aguentou tudo. Tom ficou mais uma vez impressionado com a sua capacidade de suportar a dor. Êl não chorou. Limitou-se a apertar a mão de Tom com força.
Quando o psiquiatra finalmente se calou, Êl fitou Tom.

- Não chores. Eu estou bem agora. Agora já ninguém me pode magoar. Tu não vais deixar. – Êl falava com calma, pausadamente. Cada palavra era como mais um golpe que se abria na sua carne.

As lágrimas continuavam a correr pela face de Tom, sem que ele as conseguisse controlar. Êl esperou que ele se acalmasse, depois voltou a falar.

- Ninguém tem que saber. Ninguém vai saber tudo. Eu não quero. Só precisam saber o que vêem – os hematomas, os golpes… O resto não. Eu não quero que saibam. Ninguém.

Tom concordou. O psiquiatra também.
Um motivo forte não? Para o tom ter começado a chorar
quer dizer que é grave ... E tu não nos mostras E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 856409 E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 31075
Tu queres-me matar só pode .... O que terá sido?
Bem ... mas numa conversa
que tivemos bem que vocês disseram que o Tom
iria ser um chorão de primeira xD
Ele chora por ele e pela Êl ... Eis a explicação E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 691755
Oh Gwen .... Porque não disses-te E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 622971
Capítulo 11
(anhh já viste? Falta pouco Surprised )
"- Quando Hitler percebeu que estava encurralado – começou Êl
(.........)
-Claro que tudo só se soube quando os arquivos do KGB foram abertos ao ocidente. Acho que o crânio do Hitler ainda lá está."
BEM que grannnde história fiquei a saber mais Razz
Estou a ver que temos uma personagem muito culta ...
E como é fruto da imaginação da escritora quer dizer que
temos uma escritora muito culta E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 283206
Tom ficou a observá-la. Tinha diante de si uma jovem que alguém torturara, que não sabia quem era, mas parecia ter uma cultura geral excepcional.

Era quase meio-dia. Sentiram uma batida leve na porta que se abriu em seguida…
GWEN MARIA :O EU NÃO ACREDITO QUE PARAS-TE LOGO
NA MELHOR PARTE E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 315156 QUEM SERÁ HEIN?
Gwen ....
Só te tenho a dizer que a tua fic está simplesmente
linda ... Aposto que vem muito mais por aí e esta história vai ficar
cada vez melhor esta história sim ... É digna de um livro ....
Do principio ao fim ....!
A sério que é!!
Bem Gwen só te posso pedir
que continues e que apesar de muito trabalho que estejas
a ter ... A sério ... Não desistas esta fic é digna do teu esforço
e acredita esta ... Ainda vai fazer muito furor!
Amo cada palavra escrita por ti
cada frase é um caminho aberto para a curiosidade
e uma porta a abrir para novas descobertas sobre Êl!
Gwen ... Parabéns!
Beijinhos muiito grandes titia
Gosto muito de ti
E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 913485
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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty Re: E se eu não quiser lembrar? #28 e 29

Mensagem  gwen Ter Ago 05, 2008 11:23 pm

Spoiler:

Bem, isto merece uma resposta decente...
Vamos lá ver o que se arranja...

1. Não peças desculpa pelo tamanho do comentário - quanto maior, melhor.
2. Adoro o Gustav, logo ele e a Êl tinham que ter uma relação fofa.
3. O que é que a Êl e o Tom vão ser um para o outro...
Bem, logo se vê...
4. Toda a gente chora...
5. Não sei se a relação do Tom e da Êl é realmente possivel...
Os amnésicos tendem a não confiar em ninguém...
6. Pôr a Êl a querer lermbrar-se do passado...
Não sei...
Talvez sim, talvez não.
7. O diagnóstico da Êl tem mais para saber, mas ela não quer que se saiba, logo não se sabe.
8. Vou postar o 12 já volto.

beijinhos E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 389312
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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty E se eu não quiser lembrar? #12

Mensagem  gwen Ter Ago 05, 2008 11:29 pm

# 12


- Não foi de propósito, a sério que não. Foi instintivo, na hora não pensei em mais nada, só em ampará-la…
- Eu sei pai, eu sei. A culpa não foi tua. Tem calma.
- Não posso ter calma. Ela nunca me tinha visto antes, eu não podia tocar-lhe. E eu não me limitei a tocar-lhe, eu agarrei-a!
Jorg parecia desesperado, estava sentado numa cadeira a recriminar-se há quase uma hora. Simone e Bill tentavam acalmá-lo sem êxito. Os outros permaneciam em silêncio.
- Vai ficar tudo bem, pai. – Dizia-lhe Bill, que estava ajoelhado à sua frente, com as mãos nos seus joelhos. – Não podes culpar-te dessa maneira.
- Como não posso? O Gordon passou horas ao telefone a explicar-me a situação dela, como vocês todos têm cuidado. Até o Tom tem cuidado. E eu estraguei tudo logo no primeiro dia em que a vi. – Jorg tapou a cara com as mãos.
- Pai, - Bill já não sabia o que dizer para atenuar a culpa do pai – o Tom está com ela… Ele vai explicar-lhe… Ela vai perceber…
O ambiente nas traseiras daquela casa, na pacata aldeia de Loitsche, era de velório. Quem ali aparecesse não diria que apenas duas horas antes reinava a boa disposição.

No interior da casa, um grupo de jovens procurava um bolo. No exterior, um grupo de adultos conversava sobre o medo de ir ao médico. Franziska falava sobre o seu novo projecto com Gustav e Êl.
- Já chega! Nós nunca vamos encontrar o bolo. Cá para mim vocês comeram-no! – Tom saiu de casa a bufar.
- Tom, só andas há procura há dez minutos.
- Ando não, Gustav! Andamos! Sete pessoas! Sete! E o bolo não está em lado nenhum! Eu juro que se tu não estivesses escondido atrás da Êl levavas uma sova! – Tom voltou para dentro a bufar.
O dia estava a ser alegre, Êl tinha um sorriso rasgado, sabia que, apesar dos resmungos, até Tom estava gostar da ideia da busca ao bolo.
Todos estavam felizes por Êl. Parecia realmente animada, apesar dos seus sorrisos continuarem a ser tristes. Tinha falado durante todo o dia, ainda não tinha tentado isolar-se vez nenhuma e parecia menos sobressaltada. Só o seu olhar permanecia intacto: triste, dorido, assustado…
Quase uma hora depois de terem começado a busca, o grupo regressou ao jardim.
- Desistimos oficialmente. – Anunciou Hans. O grupo estava abatido e pronto a aceitar a derrota.
- Gustav?
- Sim, mãe.
- Digam-lhes lá o que raio fizeram ao bolo.
- Oh Angela! Não estragues a brincadeira aos miúdos.
- Não faz mal, Gordon. – Gustav ostentava um sorriso triunfal. – A mim também já me apetece uma fatia de bolo. Está na cozinha.
- Ai não está não! – Mark falava como se o tivessem atacado. – Eu e a Liesel revirámos a cozinha toda. Até a máquina de lavar louça abrimos.
- Êl, a ideia foi tua, diz-lhes lá onde está o bolo. – Gustav continuava a sorrir, estava a divertir-se imenso com a situação.
- Está na cozinha. – Êl sorriu, os outros bufaram. – Debaixo da mesa, em cima de um banco.
Mark e Liesel entraram em casa furiosos – não era possível que não o tivessem visto se nem estava bem escondido. Voltaram com o bolo, afinal estava lá.
- Eu não acredito que andei a vasculhar os armários dos quartos para nada!
- Tom Kaulitz!? – Simone olhava para o filho com ar de desaprovação. – Terei ouvido bem? Tu andaste a desarrumar os armários dos quartos?
- Não, mãe, eu não disse nada disso. – Tom parecia um cachorrinho a levar um ralhete.
- Amanhã, de manhã, bem cedo, vais arrumar os estragos!
- Mas, mãe…
- E se for preciso, passas a ferro tudo o que tiveres enrodilhado!
Tom curvou os ombros com ar abatido.
- Sim, mãe. – Depois abriu um grande sorriso. – Agora já podemos comer o bolo?
- Oh! Tu não tens emenda. – Disse Simone a rir.
- Pois não. Se tivesses não era teu filho. – Acrescentou Tom, provocando uma gargalhada geral.
Enquanto Bill partia o enorme bolo de ananás, Êl esgueirou-se para dentro de casa a fim de ir à casa de banho. Quando regressou, tudo aconteceu muito depressa.
Jorg e Hagen conversavam junto à porta. Êl vinha a sair quando Kasimir, o gato de Tom, se atravessou nos seus pés. Êl ia cair, Jorg segurou-a instintivamente com força pelo braço direito. Imediatamente Êl voltou-se para Jorg com o terror estampado no rosto, que percebeu o seu erro e a largou. Mas era demasiado tarde. Êl fugiu para dentro de casa e trancou-se no quarto de Tom.
Só Gordon e Jorg deram conta do que aconteceu. Quando contaram aos outros, Tom precipitou-se para dentro de casa. Esteve dez minutos à porta do quarto, até convencer Êl que estava sozinho. Depois ela deixara-o entrar.

- Pai, - Bill já não sabia o que dizer para atenuar a culpa do pai. – o Tom está com ela … Ele vai explicar-lhe… Ela vai perceber…
Mas todos tinham medo. Era a primeira vez que Êl estava com Jorg e ele tinha-a agarrado com força.
Quase uma hora depois de se ter fechado no quarto, Êl desceu com Tom. Vinha agarrada ao braço direito dele, semi-escondida por trás das suas costas. Ainda estava assustada, mas parecia calma.
- Jorg? – Ele levantou os olhos para ela e imediatamente sentiu um aperto no peito: Êl olhava-o com o terror espelhado nos olhos. – Eu sei que não fez por mal. – Êl falava como se as palavras a magoassem. – Só quis ajudar… Eu ia cair… E o Jorg não pensou em mais nada… Só em ajudar-me a manter o equilíbrio…
Jorg assentiu com a cabeça, mas foi incapaz de falar. Aquele olhar massacrava-o, uma lágrima percorreu a sua face direita. – Como era possível aquilo acontecer? O que tinham feito àquela jovem para a destruírem daquela maneira?
- Eu vou ficar bem… – Continuou Êl. – Mas vou precisar de tempo… Se não se importar, é melhor não se aproximar muito de mim… Eu posso reagir mal… – Ao medo do seu olhar misturou-se a tristeza. Custava-lhe dizer aquilo, sabia que Jorg se sentia mal com o que tinha feito, mas o medo era mais forte do que ela.
A pedido de Êl, ninguém foi embora. Voltaram a rir e a divertir-se. Há hora de jantar, Êl chegou mesmo a sorrir ligeiramente a Jorg. Mas até quase todos partirem, Êl não largou o braço de Tom…

Continua...
Deixo aqui a história da ideia do bolo.
Basicamente mudei algo que uma vez a minha mãe fez, quando eu era pequenina.
Ela lembrou-se de esconder a travessa da carne assada num gaveta enorme que tínhamos na cozinha.
Os adultos andaram feitos parvos à procura, mas nunca o encontraram.
Ela cabou por dizer onde estava, porque os miúdos já estavam esfomeados.
Quanto ao bolo ser de ananás, é o bolo que a minha mãe mais gosta de fazer.
Acho que a história da busca ao bolo é um bocadinho em homenagem à minha mãe, que adoro.
Espero que tenham gostado.
beijinhos
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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty E se eu não quiser lembrar? #13

Mensagem  gwen Sáb Ago 09, 2008 1:44 pm

# 13

Era quase meio-dia. Sentiram uma batida leve na porta, que se abriu em seguida, era o almoço. Canja e uma papa branca que supostamente era arroz com peixe, Êl tinha dúvidas, mas não reclamou muito e comeu o mais que pôde.
No dia anterior, depois do psiquiatra partir, o médico tinha trazido uma balança – pesava 37 quilos, muito pouco para alguém com 1m70. Precisava alimentar-se bem para recuperar peso rapidamente, por isso tentava comer tudo o que lhe davam. Tudo, menos vegetais. O pior eram os comprimidos: analgésicos, antibióticos, vitaminas, ferro… Êl nem quis saber para que era aquilo tudo. Mas Gustav sim, ouvira o médico atentamente e decorara tudo.
Estava Êl a terminar o almoço, quando ouviram nova batida na porta. Era Gustav que trazia um saco de fruta.
- A comida de hospital é horrível. – Anunciou com uma careta. – Por isso comprámos fruta esta manhã. Também comprámos flores, mas não me deixaram entrar com elas. Parece que as flores trazem uma quantidade de coisas que agravam a saúde dos pacientes – desde pólenes a ácaros, passando por bichinhos minúsculos, até vírus e bactérias… Sei lá.
- Já acabaste? – Perguntou Tom. - Então bom dia para ti também.
- Oh! Desculpem, bom dia. – Gustav corou. – Que chatice! Esqueci-me do outro saco.
- Bom dia Gustav. – Disse Êl. – Que saco?
- O que a minha irmã trouxe, com pijamas e fatos de treino, para não teres de continuar com essa bata horrível do hospital. – Disse com calma. Depois virou-se para Tom. – Estão à tua espera para almoçar, a Ilsa também veio. Eu fico com a Êl até voltares.
Tom olhou para Êl.
- Não te importas de ficar com ele? Eu volto já.
Êl olhou Gustav. Não parecia perigoso e se fosse Tom não a deixava com ele.
- Não, não importo. – Acabou por dizer. – Ficas chateado se te pedir que te sentes sossegadinho? Fico mais tranquila.
Gustav sentou-se imediatamente sorrindo.
Quando ouviram a chave rodar na porta, Bill, Georg, Franzi e Ilsa calaram-se. Sabiam que era Tom. Esperaram em silêncio. Tom chegou à cozinha e viu a mesa pronta, não tinha fome, mas era preciso comer.
- O Gustav esqueceu-se dos pijamas e não deixaram entrar as flores. Vou lavar as mãos.
- Estão a ver? Eu nunca o vi assim. – Bill fitava Franzi e Ilsa com os olhos cheios de lágrimas. – Mas o pior é que vocês também vão ficar mal quando a virem.
- Porque trouxeste a Ilsa?
Tom e Franzi conversavam no quarto dele depois de almoço. Gustav telefonara a dizer que Êl adormecera.
- É simples Tom, o teu plano para ajudar esta rapariga está cheio de lacunas. Passei a tarde de ontem a pensar nisso e quando o Gustav me telefonou à noite a contar a cena dos pensos, peguei imediatamente no carro e fui falar com a Ilsa.
Na noite anterior, os quatro rapazes estavam novamente no quarto com Êl, quando os enfermeiros entraram para lhe trocar os pensos. Êl não deixou que lhe tocassem. Gritou, berrou… Dr. Kafka foi chamado e ordenou que lhe dessem sedativos. Tom não queria, preferia tentar chamá-la à razão, mas os sedativos foram administrados.
Ao recordar a cena, Tom sentiu-se derrotado, deixou-se cair na cama, enterrou as mãos na cara e começou a chorar.
Franzi sentou-se ao seu lado. Passou-lhe a mão pela cabeça e deu-lhe um beijo no ombro.
- Tens que ter clama, Tom. Nós vamos ajudá-la, não a vamos deixar desistir.
Tom olhou para ela e viu o motivo porque a tinha chamado – o seu olhar e o seu sorriso estavam inundados de carinho, força e confiança, que exalavam dela como uma aura fortalecedora. Sorriu e beijou-lhe a testa.
- Lacunas. Disseste que o meu plano para a ajudar está cheio de lacunas.
- Sim, Tom. Se não, vejamos: mais tarde ou mais cedo, ela vai ficar forte o suficiente para sair do hospital. Vamos imaginar que ela não recupera a memória até lá. O que vais fazer?
- Trazê-la para aqui.
- E deixá-la sozinha?
- Posso levá-la para casa da minha mãe.
- Para viver com duas pessoas que não conhece?
- Oh Franzi, o que é que eu faço? – Tom estava outra vez à beira das lágrimas.
- Tem calma. Eu já tratei de tudo. Ontem falei com as nossas mães, vêm cá no sábado conhecê-la. E temos a Ilsa, que está de baixa e depois de lhe contar o que sabia ofereceu-se para vir cuidar da Êl.
- Eu adoro-te. – Disse-lhe Tom, abraçando-a. – Mas o que tem Ilsa?
- Nada de grave. Há dois dias caiu e deslocou o ombro direito. Ela até queria ir trabalhar, mas o director do hospital disse-lhe que estava fora de questão.
- Havia de ser interessante, uma médica a dar consultas com um ombro deslocado. – Notou Tom com um sorriso ténue.
- Então o plano é o seguinte: - Explanou Franzi. – Primeiro conhecemos Êl e falamos-lhe da importância de mudar os pensos e a Ilsa oferece-se para o fazer – assim mais ninguém terá de lhe tocar. Depois, quando estiverem sozinhos, explicas-lhe que estaremos sempre cá enquanto tu estiveres fora. Sábado vêm as nossas mães e vão ao hospital. Fazemos de conta que vieram ver a Ilsa, porque ainda não estiveram com ela desde que se magoou.
"Tu telefonas-lhe todos os dias. Aos poucos ela vai perdendo o medo. Quando não estivermos com ela, também lhe telefonamos, para ela ver que nos preocupamos sempre. Quando estiver melhor levamo-la para casa. Achamos que deve ficar com a Simone e o Gordon, porque foi a casa em que tu cresceste – lá deve sentir-se mais segura, mais ligada a ti. E pronto, é isto.
- Bem, pensaste em tudo. – Tom estava espantado.
- É preciso mantê-la viva, Tom. Ela deve ter sofrido muito, pelo que o Bill e o Georg nos contaram. – Tom baixou os olhos, havia mais para além do que eles sabiam…
- É preciso fazê-la compreender que vale a pena viver. – Continuou Franziska. – Mostrar-lhe que existe um lado bom da vida… Dar-lhe esperança, carinho, amor… Mostrar-lhe que é seguro viver… Sim, é isso – amor, segurança, confiança – é disto que ela precisa.
Franzi estava estranha, parecia fitar o vazio, olhar para lado nenhum. Estava ausente, perdida nos seus pensamentos. Uma lágrima percorreu-lhe a face. Tom sentiu-se gelar – não sabia lidar com aquilo, não suportava quando as pessoas choravam, porque simplesmente não sabia o que fazer. Ele próprio raramente chorava, ainda que já tivesse perdido o controlo duas vezes nesse dia: primeiro com Georg, depois com Franzi.
A medo, toucou devagar no ombro da amiga que estremeceu – parecia ter esquecido onde estava.
- Desculpa. – Disse Franzi limpando as lágrimas. – Quando tinha 14 anos, um amigo sofreu uma contusão na cabeça e perdeu a memória. Tinha medo de tudo e de todos, porque não sabia em quem confiar. Achava que não havia um lugar para ele no mundo, porque não sabia quem era. Acabou por voltar à escola, talvez demasiado cedo… Éramos jovens, não soubemos lidar com aquilo… Não compreendemos que tínhamos que conquistar a sua confiança de novo… Um dia, ele não aguentou o pânico… Suicidou-se…
O olhar de Franzi estava outra vez ausente. Tom sentiu um aperto no peito. Quando a chamara não podia imaginar que a história de Êl a fosse afectar tanto.
continua...
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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty E se eu não quiser lembrar? #14

Mensagem  gwen Seg Ago 11, 2008 12:58 am

# 14


O plano de Franziska parecia estar a funcionar. Êl reagiu bem quando a conheceu e apesar de a ideia de mudar os pensos não lhe agradar, prometeu que faria um esforço na manhã seguinte quando Ilsa lhos mudasse.
Inicialmente, Tom ficou com medo da reacção do Dr. Kafka, mas Ilsa já tratara de tudo. Não te preocupes, Tom, já lhe telefonei esta manhã. – Explicara ela. – Eu e o Rudy andámos juntos na faculdade. Ele até ficou feliz, porque assim quando a levarmos para casa posso continuar a cuidar dela em Magdeburg.
A tarde tinha corrido bem e Êl adormecera cedo, continuava a dormir muito por causa da anemia e por estar tão fraca. Dr. Hoffman voltara ao fim do dia, mas Êl recusara vê-lo e acharam melhor não a contrariar.
Tom voltara a dormir no hospital. Sabia que tinha de começar a deixá-la sozinha para que se habituasse, mas queria adiar essa noite o mais possível.
Ilsa viera a meio da manhã e, depois de uma longa conversa, Tom saiu deixando-as sozinhas. Êl estava aterrorizada, não lhe agradava que lhe mexessem nas feridas, mas Tom pedira por favor…
Depois de limpar todas as infecções, Ilsa optou por diminuir o número de pensos – deixou dois nas costas, porque tinha infecções graves, um no interior da coxa direita, onde faltava um pedaço de pele. O do antebraço esquerdo, porque os golpes eram profundos, e um no abdómen, onde Êl tinha um golpe tão largo e profundo que lhe haviam dado vários pontos. Ilsa reparou numa cicatriz estranha, mas optou por não dizer nada – mais tarde falaria com Tom.
Êl tinha levado a promessa feita a Tom de se deixar tratar tão a sério, que Ilsa conseguiu mesmo dar-lhe uma espécie de banho – lavou-lhe a cabeça e passou-lhe uma esponja húmida pelo corpo. A rapariga gostou de Ilsa – ela evitara tocar-lhe, só o fazendo quando era estritamente necessário.
Há hora de almoço, Georg veio substituir Tom, para que ele pudesse ir a casa comer e tomar banho. Bill ainda pensou em substituir o irmão, mas desistiu em cima da hora – não se sentia capaz de ficar a sós com Êl.
Depois de almoçarem, Ilsa pediu para falar com Tom a sós, antes de irem para o hospital.
- O Bill disse-me que conheces o diagnóstico completo da Êl. – Ilsa falava com calma, encostada à porta fechada do quarto. Tom estava sentado na sua cama.
- Sim, conheço. – Tom estava confuso, não percebia onde ela queria chegar, mas não queria falar do diagnóstico de Êl.
- Ainda não lhe agradeci por ter vindo. – Disse numa tentativa de desviar o assunto. – A Ilsa é médica, não enfermeira. E está magoada, devia estar a descansar.
- Sabes Tom, o mundo é muito pequeno. - Ilsa pareceu entristecer de repente. – Eu conheci a Franzi há muitos anos, quando ela ainda era uma adolescente. Acho que nesse tempo o Georg e o Gustav ainda não eram amigos. – Ilsa sentou-se junto de Tom. – Conheci-a em casa de uma amiga, no funeral do seu filho. A Franziska estava abatida, com o olhar perdido, doeu-me tanto vê-la assim que me aproximei dela. Falámos durante quase uma hora e nunca mais perdemos contacto.
- Não sabia que eram tão próximas. – Tom observava Ilsa. Conhecia-a há vários anos, mas só então reparou como é parecida com o filho: tem o mesmo cabelo e o mesmo nariz, mas os olhos não, os de Ilsa são castanhos.
- Quando na terça-feira à noite abri a porta à Franzi, – Ilsa continuou a Falar com olhar distante. – ela estava com um brilho estranho nos olhos. Parecia que a sua aura tinha desaparecido, estava confusa… Olhou-me e disse-me: Eles encontraram uma rapariga, está amnésica…
Tom começava a perceber, a juntar as histórias.
- O filho da sua amiga – disse após instantes de silêncio – é o amigo da Franzi, aquele que se suicidou…
Ilsa olhou-o nos olhos.
- Sabes Tom, quando perdes alguém que te era próximo, alguém que precisava de ajuda, mas tu não conseguiste ajudar, isso marca-te. Não me culpo pela morte daquele rapaz, nem a Franzi, nem ninguém que o conheceu. Mas aquilo marcou-nos. Depois da morte dele, todos tivemos de reaprender a viver. Os pais têm agora um centro que ajuda jovens com problemas psicológicos. Eu prometi ficar atenta, alerta – da próxima vez que me cruzasse com alguém com um problema semelhante iria usar o que aprendi para ajudar. Creio que a Franzi fez o mesmo.
Ilsa sorriu ao ver o ar confuso de Tom.
- É a nossa maneira de o homenagear, de mostrar que ele não morreu em vão. Nós não soubemos ler os sinais, mas ficámos a conhecê-los, agora será mais fácil…
- Mas vocês nem conhecem a Êl. – Tom estava perplexo com uma mostra tão grande de altruísmo.
- Nem tu. E no entanto estás aqui. – Ilsa voltou a sorrir.
Tom desviou o olhar. Pelo seu cérebro voltou a passar a imagem daquela madrugada no parque… Os olhos da rapariga estavam vazios… Ela ia morrer… E sabia que ia morrer…
- No que depender de nós, – Tom foi arrancado àquela memória dolorosa pela voz suave de Ilsa – a Êl vai recuperar. E mesmo que a sua memória não volte, ela pode começar uma nova vida, rodeada de novos amigos.
Tom fitou a mãe do amigo. O seu olhar transmitia calma, segurança, certeza. Lembrou-se das palavras de Franziska: amor, segurança, confiança – é disto que ela precisa.
- Sim! – Disse finalmente com um pequeno sorriso. – Nós vamos conseguir.

Ilsa levantou-se, cruzou os braços. Olhou-o profundamente.
- Com isto tudo, – disse com voz segura – quase me esquecia do motivo porque quis falar contigo.
Tom fechou os olhos e suspirou – lá vinha o diagnóstico.
- Ontem, – continuou Ilsa – quando vos deixei no quarto com Êl, estive a falar com o Rudy. Queria revelar-me o diagnóstico. Eu disse que não.
Tom abriu os olhos e fitou-a.
- Não compreendo! – Exclamou confuso. – Se vai cuidar dela faz sentido que conheça o diagnóstico completo.
- Eu vim aqui como alguém que quer ajudar, não como médica. Por isso, só quero saber o que ela quiser contar.
- Então já sabe tudo: hematomas, golpes, anemia… – Tom voltou a fechar os olhos, deixou-se cair para trás, ficou deitado de costas.
- Eu vi uma cicatriz… – começou Ilsa.
- Ela tem tantas… – Tom não queria falar daquilo… Não podia… Tinha prometido… Era mais fácil poder partilhar… A verdade era tão pesada… Mas não podia…
- Esta é diferente. – Continuou Ilsa. – Faço uma pequena ideia do que seja. Quero apenas saber se os médicos acreditam que foi feita pelas mesmas pessoas que lhe fizeram o resto. Podia perguntar ao Rudy, mas se o fizer ele vai dizer-me mais do que eu perguntar.
Tom não respondeu logo. Ficou a ponderar a resposta. Ilsa era médica… Claro que tinha percebido… Não tinha certezas… Mas não devia andar longe da verdade…
- As análises ao sangue… – Disse Tom finalmente, voltando a sentar-se. – Revelaram algumas coisas… Analgésicos, antibióticos, vários tipos de medicamentos… Alguns são usados em pós-operatório…
Tom calou-se. Ficou a olhar Ilsa por instantes, depois levantou-se olhou para um ponto no ar, ligeiramente acima do ombro esquerdo da médica.
- Os hematomas, os golpes, a anemia… É tudo… Não há mais nada a saber… – Tom voltou a olhar para a mãe do amigo.
Ilsa compreendeu. Pousou a mão esquerda no ombro direito de Tom e sorriu-lhe, dizendo:
- Não há mais nada a saber…

Continua...
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E se eu não quiser lembrar? #28 e 29 Empty E se eu não quiser lembrar? #15

Mensagem  gwen Qua Ago 13, 2008 12:38 am

Eu devo ser masoquista ou já teria deixado de postar aqui, afinal ninguém lê, mas enfim...
Tenho alguns capítulos preferidos e o 15 é sem dúvida um deles.




# 15



O dia tinha sido longo. Êl estava cansada, mas não conseguia dormir. Estava deitada de lado e olhava a guitarra que estava encostada à parede. Aquela era a primeira guitarra de Tom, com que ele tinha aprendido a tocar, a que Gordon lhe dera aos sete anos.
A casa estava silenciosa. Já quase todos tinham ido embora. Quando subiu para tomar banho, Êl deixara na cozinha apenas Simone, Gordon, Bill, Tom, Gustav, Georg e Fran, que arrumavam as últimas coisas. Tentara ajudar, mas Gordon impediu-a.
- Não, não e não! – Dissera-lhe peremptoriamente enquanto lhe apontava o indicador direito. – Mas é que nem penses. Vais mas é tomar banho. O dia de hoje foi programado para te animar. Não me faltava mais nada do que chegasses ao fim a trabalhar.
- Mas Gordon, – começara Êl – isso não faz sentido nenhum…
- Se preferires, posso pedir ao Tom que te meta na banheira à força! – Gordon esforçava-se por não rir e parecer sério.
Ficaram a olhar-se uns instantes. Depois, Êl sorriu, encolheu os ombros, deitou a língua de fora a Gordon, virou-se e saiu da cozinha deixando atrás de si um coro de gargalhadas e um resmungo de Bill.
- A mim nunca me proibiste de trabalhar! Francamente mãe, que belo padrasto me arranjaste!
- E não fales nesse tom que ainda tens idade para ficar de castigo! – Respondeu Gordon, provocando nova onda de risos.
Meia hora depois, deitada na cama, Êl pensava que deveria voltar a descer, mas estava tão cansada… Deixou-se ficar, a olhar a guitarra de Tom e a recordar a primeira vez que a viu…
Sábado, 31 de Maio. Êl terminava o pequeno-almoço sob o olhar preocupado de Franzi – a rapariga ainda não tinha dito uma palavra desde que acordara uma hora antes. Lá fora continuava a chover. Êl estava abatida… Os rapazes tinham ido embora… Tom tinha ido embora…
Passados alguns minutos ouviram uma batida na porta.
- Devem vir buscar as coisas do pequeno-almoço. - Disse Franzi.
Mas não… Era Tom. Trazia uma guitarra e um enorme sorriso.
- Tom? Que fazes aqui? – Perguntou Franzi, levantando-se com ar preocupado. – Não devias estar a caminho do aeroporto?
- Devia. – Tom encolheu os ombros com ar culpado. – Mas fugi. O Saki vai matar-me, mas não faz mal.
Franzi Sorriu.
- Vou deixar-vos a sós. Mas não demores, ou o Saki mata-me por cumplicidade.
- Oh! O Saki adora-te. Aliás, ele costuma dizer que se tu trabalhasses connosco provavelmente não fazíamos metade dos disparates. – Tom olhava para ela com ar esperançado.
- Tom, já falámos sobre isto: não vou trabalhar convosco. – Saiu fechando a porta devagar.
Tom encolheu os ombros e virou-se para Êl com um grande sorriso.
- Bom dia, donzela élfica.
- Bom dia. Não devias ter vindo, não quero que tenhas problemas. – Êl olhava-o com ar preocupado.
- Oh, não fiques assim. O Saki hoje dá-me um sermão, mas amanhã já lhe passou e posso voltar a fazer asneiras. – Encolheu os ombros e fez uma careta, depois sentou-se e começou a tocar.
Êl ficou a ouvir, era a primeira vez que ouvia Tom tocar. E depois, para surpresa de Êl, começou a cantar, devagar, a acompanhar a música.
Keiner weiss, wie’s dir geht.
Keiner da, der dich versteht.
Der Tag war dunkel und allein.
Du schreibst Hilfe mit deinem Blut.
Obwohl e simmer wieder wehtut.
Du machst die Augen auf und alles bleibt gleich.
Ich will nicht störn
und ich will auch nicht zu lange bleiben.
Ich bin nur hier um dir zu sagen.
Ich bin da, wenn du willst.
Schau dich um, dann siehst du mich.
Ganz egal, wo du bist.
Wenn du nach mir greifist, dann halt ich dich.
Dein Leben sinnentleert
deine Schatten tonnenschwer.
Und alles was du jetzt brauchst, hast du nicht.
Du suchst den Regenbogen.
Er liegt tot vor dir am Boden.
Er hat solang es ging gestrahlt, nur für dich.
Ich will nicht störn
und ich will auch nicht zu lange bleiben.
Ich bin nur hier um Dir, zu sagen.
Du bist nicht allein
Ich bin an deiner Seite.
Ich bin da, wenn du willst.
Schau dich um, dann siehst du mich.
Ganz egal, wo du bist.
Wenn du nach mir greifst, dann halt ich dich.
Wenn du die Welt nicht mehr verstehst,
und jeder Tag im Nichts vergeht.
Wenn sich der Sturm nicht mehr legt,
Und du die Nacht nicht mehr esträgst.
Ich bin da wenn du willst
ganz egal wo du bist.
An deiner Seite nur eine Weile.
Ich bin da,
Ich bin da, wenn du willst.
Ich bin da, ganz egal wo du bist.
Ich bin da, schau in dich rein dann siehst du mich.
Ich bin da
Wenn dun ach mir greifist dann halt ich dich.
Ich bin da wenn du willst
ganz egal wo du bist.
Na deiner Seite, nur eine Weile.
Du bist nicht alleine.
Tom não tinha a voz do irmão, mas não se safava nada mal. Quando terminou ficou a olhar Êl, com um sorriso envergonhado.
- Não é suposto essa música ser mais animada? – Perguntou Êl com voz serena.
- Oh, pois… – Disse Tom encolhendo os ombros. – Mas sem os outros foi o melhor que se arranjou…
Êl levantou-se devagar, aproximou-se de Tom e deu-lhe um beijo suave na testa, depois sorriu ligeiramente.
- Foi bonito, obrigada.
Era a primeira vez que Êl sorria. Tom estava habituado a vê-la com esboços de sorrisos – pequenos tremores nos lábios, ligeiras contracções nos cantos da boca, mas sorrir mesmo, nunca. Pegou-lhe na mão e beijou-a ao de leve, deixando escapar uma pequena lágrima. Depois levantou-se e olhou-a nos olhos.
- Eu vou estar sempre aqui, sempre. Não importa onde esteja, até posso estar do outro lado do mundo, mas vou estar sempre aqui.
- Eu sei, Tom, eu sei.
Ouviu-se uma leve batida na porta, que se abriu revelando um homem alto, forte, moreno, com cabelo curto. Êl achou que ele tinha um sorriso bondoso.
- Desculpem interromper. Mas, Tom temos mesmo que ir.
- Pois, Saki, já vou… – Respondeu-lhe Tom atrapalhado.
- Não lhe ralhe muito. Ele só veio ver-me. – Êl olhava Saki e falava a medo.
- Não te preocupes, não lhe vou ralhar. – Saki sorria a Êl. – Mas não precisava ter fugido, se me tivesse pedido, eu trazia-o cá. – Saki fez uma pausa. Olhou Tom. – Bem, espero cá fora. Dois minutos, não podemos demorar mais, os outros já foram para o aeroporto. – Saiu, fechando a porta devagar.
Êl olhou Tom.
- Tens de ir.
- Pois tenho. Mas volto. E telefono-te todos os dias, montes de vezes. Prometo.
Êl voltou a sorrir.
- Deixo-te a minha guitarra. Toma bem conta dela, foi a primeira que tive, prenda do Gordon, o meu padrasto.
Tom voltou a sorrir e depois saiu.
Enquanto recordava a cena, Êl não pôde deixar de sorrir. As coisas tinham mudado… Já não estava no hospital… Já não tinha tanto medo… Mas continuava a não querer lembrar. E a guitarra… A guitarra continuava com ela… Tomou uma decisão – quando Tom voltasse a partir, ia pedir a Gordon que a ensinasse a tocar guitarra.


continua...
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