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Somos capazes de nos habituar a tudo…

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Somos capazes de nos habituar a tudo… Empty Somos capazes de nos habituar a tudo…

Mensagem  gwen Dom Mar 15, 2009 1:52 am

Somos capazes de nos habituar a tudo…



Sentado à janela, a olhar o corrupio de pessoas lá fora que aproveitam o sol para sair à rua e se divertirem, não consigo deixar de mergulhar no vazio que me rodeia…

Grupos de jovens caminham sem destino e riem alto, apenas pelo prazer que a companhia uns dos outros lhes proporciona… Conversam sobre tudo e sobre nada… Riem dos outros e de si próprios… São um grupo coeso… Um grupo em que todos se sentem bem… Um grupo em que os defeitos e as qualidades de todos são aceites…

Um desses grupos parou lá em baixo no jardim… Sentam-se em todo o lado: no banco, nos rebordos dos canteiros, ou simplesmente na relva. São realmente jovens, a idade média deve rondar os catorze anos… São amigos… São felizes… Há um laço invisível que os une, que os torna quase inseparáveis…

Também fui assim um dia… Talvez o grupo não fosse tão grande… Mas era um grupo que me aceitava… Riamos… Conversávamos…. Falávamos de tudo e de nada… Ríamos dos outros e de nós… Éramos felizes… Pelo menos eles eram… Mas eu quis mais… Eu quis sempre mais…

Desejei que o mundo me conhecesse… Desejei que o mundo gostasse de mim… Desejei ser famoso… E tornei-me famoso… Mas a que preço? Não será a solidão um preço demasiado alto a pagar pela concretização de um sonho? E, afinal, porque me sinto só?



Na base da fama e do sucesso está o trabalho, mas também a amizade… Não fosse a amizade que nos une, os Tokio Hotel não poderiam existir… Se não confiássemos plenamente uns nos outros, não conseguiríamos aguentar a pressão… Se não estivéssemos cá uns para os outros, não suportaríamos o cansaço… Não estou sozinho… Sei que não estou… Mas então por que sinto que a solidão me rodeia de todos os lados? Porque sinto um vazio acumular-se dentro de mim, como se o meu corpo fosse apenas constituído por uma camada de pele, que se mantém moldada apenas por ventos frios, que preenchem o interior de uma embalagem oca, seca e desprovida de calor?



Não sei quando começou este sentimento… Não sei de onde veio… Não sei como se apoderou de forma tão intensa, profunda e dominadora de mim… Sei que se instalou de forma tão permanente, que por vezes tenho a sensação que esteve sempre cá, guardado em algum lugar recôndito do meu ser… Às vezes, parece que já nasceu comigo e esteve anos a aguardar um momento de isolamento para se manifestar e se assumir como controlador de um ser condenado à insatisfação…

Não serei eu isso? Um ser que nunca está bem com o que tem?

Desejei a fama e tornei-me famoso… Desejei ser conhecido e o mundo todo ouviu falar de mim… Desejei ser idolatrado e os clubes de fãs multiplicaram-se… Desejei fugir da minha terra e percorri metade do mundo... Desejei...

O que desejei afinal? Bem no fundo do meu ser, o que desejei afinal? Terei esquecido o que era realmente importante para me concentrar no que é apenas fútil? Terei esquecido amigos, família, carinho, amor, amizade? Terei pensado apenas em fama, reconhecimento, sucesso?

Não… Creio que não… Tenho amigos… Continuo fortemente ligado à minha família… Com eles ainda consigo ser o menino sonhador que um dia desejou conquistar o mundo… Com eles ainda consigo sorrir… Conversar… Falar de tudo e de nada… Ser feliz… Será que ainda consigo ser feliz? Ou será que, mesmo quando estou com as pessoas que são realmente importantes, o meu sorriso é apenas mecânico? A minha alegria é apenas momentânea?



Digo todos os dias a mim mesmo que não estou só… Digo todos os dias a mim mesmo que a solidão não passa de uma ilusão que ataca nos dias em que estou desanimado e cansado… E é isso mesmo que ela parece, quando estou com aqueles que mais amo… Com aqueles que me aceitam e sempre aceitaram como sou… Mas será que não estou apenas a enganar-me a mim mesmo? Afinal, o vazio continua cá…





O jovem grupo de amigos volta a partir, deixando o pequeno jardim ensolarado vazio… Talvez eu seja apenas como aquele jardim… Quando os amigos estão próximos, tenho a falsa sensação de ver os ventos frios que me preenchem acalmarem ligeiramente… Apenas para os ver ressurgir quando eles se afastam… Então, fico apenas como o jardim lá em baixo, só, abandonado… Mesmo que haja alguém no mundo a dirigir-me os seus pensamentos… Tal como o sol dirige os seus raios ao pequeno jardim…



Lembro-me de quando era procurado pelos amigos para sair, para conversar, para aconselhar… Quantas lágrimas sequei? Quantas dúvidas dissipei? Quantas cartas de amor escrevi, para que outros as assinassem? Quando foi que isso se perdeu? Quando deixei de ser amigo, conselheiro, confidente? Quando passei a ser apenas mais um do grupo? Quando passei a ser apenas conhecido e não amigo? Será que fui eu que mudei? Ou terão sido os outros?

Sempre fui forte, independente… Sempre fui capaz de encontrar solução para os problemas dos outros… Sempre estive rodeado de pessoas… Nunca estive sozinho… Então, porque sinto que sempre estive só? Porque me senti sempre diferente? Porque nunca consegui encontrar uma solução para os meus problemas? Para o meu vazio interior?



Milhares de jovens no mundo estariam dispostas a sacrifícios para passar meia hora comigo… Para me verem de perto… Para falarem comigo… Para me tocarem… E, no entanto, nada disso que conforta… Poderei ainda pedir mais? Poderei desejar mais? Não tenho tudo o que desejei? Fama… Sucesso… Atenção… Dinheiro… Mas o vazio continua cá…





- Bill!? – Tom espreita pela porta entreaberta e fita-me com o seu habitual sorriso bem-disposto. O brilho dos seus olhos desvanecesse lentamente ao aperceber-se do meu estado letárgico. Consegue sentir que não estou bem… Consegue perceber que estou a sofrer… Mas não compreende porquê… Talvez seja isso que mais lhe dói… Não compreender a origem da minha dor… Não saber como me ajudar…

- Os rapazes vêm cá jantar… - Entra no quarto e olha-me intensamente, mas imprime um tom animado à voz. – Depois vou sair com o Georg. O Gustav diz que não está para aí virado hoje. Vens connosco? – Limito-me a abanar a cabeça de forma negativa. Tom sorri de forma compreensiva. – Então ficas com o Gustav… Já estou a ver as duas comadres na má-língua toda a noite! – Revira os olhos de forma irónica.

Vejo-o sair do quarto de forma relutante… Conhece-me demasiado bem… Sabe que não estou bem… Mas também sabe que não vou falar com ele… Sabe que no estado em que me encontro nunca falo com ninguém… Nem poderia falar com Tom… Como lhe diria que me sinto só e abandonado? Como poderia dizer-lho a ele? Tom esteve sempre cá… Estará sempre… Jamais me abandonará, tal como eu jamais o abandonarei a ele… Sei disso… Sei que nada poderá mudar este facto… Mas então, de onde vem este vazio que me preenche?



Sair… Talvez devesse ir com eles… Não! Não seria capaz… Não no estado em que encontro… Não quando sinto um desespero avassalador tomar conta de mim… Parece que os ventos frios que me preenchem se revoltaram numa tempestade destruidora, capaz de romper a fina camada de pele que me dá forma… Quando tal sentimento me domina só quero ficar sossegado na tentativa de impedir que o meu corpo de despedace e o vazio me destrua irremediavelmente… Preciso ficar quieto… Preciso ficar só… Misturar-me com uma multidão só me faria sentir pior… Mais isolado… Mais diferente… Mais excluído…

Não é primeira vez que sinto este estranho desespero… Não é primeira vez que tenho a sensação de ser uma embalagem oca e frágil… Nestes dias, sinto vontade de arranhar a minha própria pele… Sinto vontade de arrancar os cabelos… Sinto vontade de apertar a cabeça até sentir uma dor lancinante que me prove a existência de algo lá dentro, para além do simples vazio. Nestes dias, procuro isolar-me… Porque tudo e todos me parecem irritantes… Porque nada nem ninguém pode impedir que o meu corpo se destrua e desapareça…

Amanhã estarei melhor…É sempre assim… Estou sempre mais calmo no dia seguinte… Mais conformado com o meu vazio… Mais resignado ao nada que me preenche… Agora já não é tão difícil… Já aprendi a lidar com este turbilhão de sentimentos desesperantes… Já conheço todas as fases deprimentes deste ser desprovido de vida que sinto ser…

Porque, no fundo, somos capazes de nos habituar a tudo… Até à solidão…
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